É inadmissível que seguidores de Bolsonaro neguem os fatos da história

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A ira e a intolerância marcam as manifestações dos seguidores do presidenciável Jair Bolsonaro na postagem em que eu registro a ironia do fato do padre Flávio Jorge Miguel Júnior, diretor-presidente do Conselho de Administração da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Sorocaba, ter sido homenageado na Câmara Municipal de Sorocaba com a Comenda “Alexandre Vannucchi Leme” (sorocabano desaparecido no regime militar) de Direitos Humanos e Defesa da Liberdade e da Democracia, no mesmo dia em que ele recebeu em sua casa Eduardo Bolsonaro.

É compreensível os ataques como instrumento de defesa de um ponto de vista que se materializa na escolha de um candidato.

Embora não goste, tolero que me ataquem com injúrias, difamações e até calúnias, pois entendo que isso faz parte do momento de efervescência pelo qual o país passa há pelo menos cinco anos.

Mas é inadmissível que entre os agressores de minha postagem exista quem negue o período terrível da Ditadura Militar no Brasil, dizendo que isso é criação da Comissão da Verdade.

Há muita burrice nas manifestações, grande parte delas fruto da limitação dos autores das manifestações em dominar a Língua Portuguesa. É evidente uma falta de capacidade de compreender e interpretar o meu texto. São vítimas de um processo catastrófico pelo qual passa o ensino público, em particular, no Brasil. Mas negar um período da história não merece qualquer tipo de tolerância.

Aliás, nem o próprio candidato deles negou. Ao contrário, enaltece sempre que pode e assim o fez na votação do impeachment de Dilma, em 2016. Na oportunidade cada parlamentar dizia uma frase para justificar o seu voto pela cassação e Bolsonaro quis homenagear Carlos Brilhante Ustra, o único brasileiro declarado pela Justiça torturador na ditadura que ajudou a institucionalizar a prática no Brasil.

Seleciono, entre centenas de depoimentos possíveis, três que expressam bem o que foi o período em que o candidato de meus agressores, na postagem de minha publicação, tanto enaltece e convido a quem crê que que não houve ditadura no Brasil a refletir:

Hecilda Fontelles Veiga, presa no quinto mês de gravidez, em 1972, em Brasília. Hoje vive em Belém, onde é professora de Ciências políticas da Universidade Federal do Pará: “Quando fui presa, minha barriga de cinco meses de gravidez já estava bem visível. Fui levada à delegacia da Polícia Federal, onde, diante da minha recusa em dar informações a respeito de meu marido, Paulo Fontelles, apanhei e comecei a ouvir, sob socos e pontapés: ‘Filho dessa raça não devia nascer’. (…) me colocaram na cadeira do dragão, bateram em meu rosto, pescoço, pernas, e fui submetida à ‘tortura científica’. Da cadeira em que sentávamos saíam uns fios, que subiam pelas pernas e eram amarrados nos seios. As sensações que aquilo provocava eram indescritíveis: calor, frio, asfixia. Eu não conseguia ficar em pé nem sentada. As baratas começaram a me roer. Aí me levaram ao hospital da guarnição em Brasília, onde fiquei até o nascimento do Paulo. Nesse dia, para apressar as coisas, o médico, irritadíssimo, induziu o parto e fez o corte sem anestesia.”

Yara Spadini, agente pastoral, foi presa em 1971, em São Paulo, onde é professora aposentada da PUC: “Era muita gente em volta de mim. Um deles me deu pontapés e disse: ‘Você, com essa cara de filha de Maria, é uma filha da puta’. E me dava chutes. Depois, me levaram para a sala da tortura. Aí, começaram a me dar choques direto da tomada no tornozelo. Eram choques seguidos no mesmo lugar.”

Dileá Frate, jornalista e escritora com vários livros publicados, dirigiu por mais de 20 anos o programa de Jô Soares, em São Paulo. Foi presa em 1975, quando estudava jornalismo: “Dois homens entraram em casa e me sequestram, juntamente com meu marido, o jornalista Paulo Markun. No DOI-Codi de São Paulo, levei choques nas mãos, nos pés e nas orelhas, alguns tapas e socos. Num determinado momento, eles extrapolaram e, rindo, puseram fogo nos meus cabelos, que passavam da cintura”.

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