Em apenas 2 dias, 11 mulheres sorocabanas já pediram proteção judicial contra a agressão de seus companheiros. Esse dado e depoimento de filha da vítima ajudam a entender a onda de assassinatos de mulheres na cidade

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EuEmanuelaBarrosEmanuela Barros, advogada e membro do Conselho Municipal de Direitos da Mulher de Sorocaba, foi a entrevistada na coluna O Deda Questão no Jornal Ipanema (FM 91,1Mhz) na manhã de hoje e deu uma aula, bastante didática, sobre o crime de feminicídio (onde o homem sente-se dono da mulher e trata-a como coisa e no limite se vê no direito de mata-la).

A entrevista ajuda a sociedade Sorocaba a compreender este momento onde a cada 8 dias (entre os dias 16 de novembro de 2017 e 3 de janeiro de 2018) uma mulher vem sendo assassinada na cidade.

Agressões diárias

Em sua entrevista, a advogada que desde o ano 2000 atende questões de família e tem dezenas de clientes vítimas da violência, explicou que a morte de uma mulher, por ela ser mulher, por parte do homem com quem ela tem algum relacionamento, é apenas o ápice de um processo de violência. Ela explica que a tensão que leva a alguma agressão vem sempre acompanhada de um arrependimento. E depois volta a ocorrer. E essa relação de opressão e violência vai aumentando a ponto de virar a epidemia que se vive, onde os assassinatos assustam.

A certeza da mulher – que ao não denunciar o marido ou companheiro agressor estará protegendo o filho e a família – leva ela a não formalizar acusação contra o agressor; a dependência financeira também ajuda a explicar a não denúncia; a recusa da família em receber de volta uma filha também. Mas a essência é a cultura do machismo que vê a mulher como alguém inferior, a vê como uma coisa.

Dentro dessa explicação, onde prega a necessidade da conscientização da sociedade como um todo, Emanuela Barros trouxe dois dados alarmantes, um deles que recebeu ao vivo durante o programa, de que apenas na quarta-feira, dia 3 de janeiro, segundo dia útil de 2018, 6 mulheres foram ao Fórum de Sorocaba buscar proteção judicial contra companheiros agressores e nesta quinta-feira, hoje, dia 4, mais 5 mulheres fizeram o mesmo pedido de proteção. Ou seja, se nada for feito, são potenciais vítimas de assassinatos.

Emanuela Barros enalteceu a série de aparelhos que a sociedade sorocabana tem para proteger as mulheres, como abrigos, centros de referências, delegacias especializadas e classificou como sendo uma cidade privilegiada nesse sentido, porém, explicou ela, falta uma articulação para que todos estes aparelhos funcionem de maneira articulada e não isoladamente como ocorre hoje, enfim, falta uma política pública para esse fim.

O relato da filha

O caso mais recente de assassinato de mulher envolveu dois escreventes da Vara Cível do Fórum da Comarca de Sorocaba, onde José Júlio Ferreira Cintra de Almeida Prado Júnior matou a companheira Simone Lanzoni na cama deles, na casa onde moravam na rua Rio de Janeiro. Ele se matou em seguida.

O motivo da morte, quem melhor explica, é Beatriz Lanzoni, filha de Simone. O relato dela escancara uma realidade que muitas outras famílias, bem provavelmente, vivem. Leia abaixo o relato dela.

Beatriz Lanzoni, filha de Simone, usou sua página no Facebook para se expressar sobre o assassinato de sua mãe. Leia a íntegra:

Bom, já que está no jornal, eu vim aqui explicar o que aconteceu.

Minha mãe, a mulher mais maravilhosa que eu já conheci, foi morta pelo namorado.

Ela me ligou ontem, chateada, porque eles tinham discutido mais uma vez. Eu pedi pra ela voltar pra casa, pra me ligar de manhã. Hoje à tarde, recebo uma ligação do meu pai.

O cara tinha matado minha mãe. Lendo a matéria no jornal, descubro que ele deu um tiro na cabeça dela na cama, provavelmente enquanto ela dormia, e se matou depois.

Foi isso que aconteceu. José Júlio Ferreira Cintra de Almeida Prado Júnior matou minha mãe. Deu um tiro na cabeça dela. Por ciúme. Ele deu um tiro na cabeça da minha mãe porque ele tinha ciúme, porque ele era doente, controlador, machista e covarde. Porque minha mãe passou o ano novo com a família dela em outra cidade e não levou ele.

Foi isso que aconteceu. Mais uma mulher. A minha mulher. A mãe do Lucas e do Gustavo. E ninguém teve a chance de se despedir.

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