Sociedade não tolera mais homem fazendo “homice”. Ainda bem

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Durante a sessão na Alesp (Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo), no dia 17 de dezembro, a deputada Isa Penna (PSOL) foi apalpada pelo deputado Fernando Cury (Cidadania) na altura de seus seios.

A cena foi gravada pelo circuito interno da casa de leis e já correu o mundo. Pela gravação, é possível ver que antes do assédio, Cury conversava com o deputado Alex de Madureira (PSD), vice-presidente da Comissão de Ética. Madureira tentou segurar o braço de Cury com o intuito de impedir que o deputado Cury se dirigisse até a deputada do PSOL, mas não conseguiu.

A Procuradoria-Geral de Justiça do Estado de São Paulo vai intimar o deputado Cury a depor no caso do assédio sexual por  “importunação sexual”, mais conhecido por assédio sexual. No caso de uma eventual condenação, a pena varia de 1 a 5 anos de reclusão ao criminoso.

Cury usou o plenário da Alesp, no dia seguinte ao episódio, para se desculpar. Isa Penna, em entrevista ao programa Fantástico, da TV Globo, na noite deste domingo (20/12), disse que não o perdoa: “Eu não aceito e nem as mulheres brasileiras aceitam o pedido de desculpas do deputado. O que ele cometeu foi crime. Ele precisa, no mínimo, começar a reconhecer que cometeu um crime. Para a gente começar a debater qual é a retratação cabível à altura do que ele fez. O corpo é nosso. Não é público. Só toca no corpo de uma mulher quem ela quiser”. Num outro trecho ela afirma querer “a cassação do deputado porque o que ele fez limita a vida das mulheres. O exemplo que ele deu enquanto autoridade pública, para não dizer que incita, eu digo que encoraja a violência contra as mulheres”

Ao Fantástico, Isa Penna relatou que estava conversando com a Mesa Diretora para saber quantos projetos faltavam para serem discutidos, quando o deputado a abordou por trás. “E falei: ‘tá louco? Quem é você, para estar encostando em mim?’. Até falei: ‘sou casada’”. Segundo a deputada disse na reportagem, durante a votação do orçamento alguns deputados faziam uma confraternização. “Justamente pela proximidade dele [Cury], é que eu saquei que ele estava alcoolizado. Aí eu falei: ‘tá bêbado? Sai daqui. Tira esse palhaço daqui’”.

A deputada explicou que registrou boletim de ocorrência contra o deputado estadual por importunação sexual “pois meu objetivo não é fazer uma caça às bruxas. Eu quero construir uma ponte com as pessoas que estão acompanhando esse caso. Não vou compactuar com linchamento, autoritarismo, mas vou pedir a responsabilização dele”, afirmou.

Mas por que ele fez isso?

A pergunta que todo mundo tem feito desde a ocorrência desse episódio é o que deu em Cury? Por que ele fez isso?

O fato de estar bêbado, hipótese levantada pela deputada vítima da agressão, em minha opinião apenas ajuda a entender, mas não explicar, o que ele fez.

A única conclusão que chego é a de que Cury fez “homice”, um neologismo que une as palavras Homem e Sandice, substantivo feminino que significa “ato, dito ou afirmação que traduz ignorância ou falta de inteligência; disparate, tolice, parvoíce”.

O fato de um colega ter tentado segurar Cury frações de segundos antes dele se dirigir à deputada agredida é o claro indicativo de que Cury havia desafiado, havia se vangloriado de que era capaz daquilo para seus colegas. Coisa típica de homem, homem machista, homem que necessita demonstrar coragem para os outros machos do grupo.

Não foi à toa que o alvo foi a deputada Penha. Ela tem sua história de vida ligada a causa de minorias sejam elas os dos sem moradia, homossexuais, mulheres, negros… Ela é combativa e isso atemoriza os homens. Ela, portanto, é o alvo perfeito para alguém mostrar que é “macho”.

Essa necessidade de mostrar que é macho é algo que nasce dentro de casa. Não tenho como saber, mas suponho que quando era criança a mãe, pai, tio, irmão queriam que o então Fernandinho mostrasse que era “Homem”. Ele deve ter passado por várias provações deste tipo. Possivelmente apareça alguma empregada que foi vítima do adolescente Fernando. São suposições. Pois só elas ajudam a entender o que um pai de família, representante do povo paulista eleito com milhares de votos, tenha agido do modo que agiu.

A sorocabana Maria Lúcia Amary, presidente da Comissão de Ética da Assembléia Legislativa, tem sido exemplar, no meu entender, no modo como tem conduzido esse caso. A declaração de Isa Penha, de quem não quer o linchamento de Cury, mas que ele pague caro pelo que fez, para servir de exemplo, me parece o único caminho para “educar”, ou melhor, reeducar os futuros homens. Cury, estimulado pelo álcool, como observado pela vítima, ficou sem filtros para que aquele menino, na cozinha ou sala de sua casa, se manifestasse no adulto que hoje frequenta a principal casa de leis do Estado de São Paulo. O que Cury fez é algo que estava dentro dele, da sua formação, que ele obviamente sabe que é absurdo. É algo que “escapou”. Só escapa o que está preso.

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