Um bom ano a todos?

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Na véspera de Natal, por volta das 21h, parei o carro que eu estava dirigindo com o pisca alerta ligado numa Faixa-Viva da avenida Américo Figueiredo no bairro Júlio de Mesquita Filho. Ao meu lado, já havia outro carro parado esperando os fiéis da Igreja Congregação Cristã do Brasil atravessarem. Eles saiam do culto de Natal e se dirigiam ao bolsão de estacionamento que fica na parte baixa da praça Nilson Lombardi. Uma igreja inteira saia. Momentos antes havia garoado e o cão estava escorregadio.

Quando parecia que o fluxo de pessoas havia parado e os carros poderiam acelerar, aconteceu o impensável: uma moça com problemas de locomoção, usando muletas, e sua acompanhante, uma senhora bastante obesa, resolveram também atravessar. Mas assim que a senhora obesa colocou o pé esquerdo na Faixa-Viva um motociclista, em alta velocidade, passando no espaço que há entre a Faixa-Viva e a sarjeta da calçada, a atingiu em cheio. Ela ficou com as pernas torcidas no chão. A moça de muleta não se sustentou e desabou. O motociclista, um jovem, de bermuda e camiseta, muito magro, sem tirar o capacete, se levantou incrédulo do que estava acontecendo. Sua reação me fez crer que ele estava drogado (afinal o que explica alguém passar na velocidade que ele passou, no cantinho que ele passou e com tanta gente atravessando a Faixa-Viva?), mas pode ser que estava apenas em choque.

A multidão de irmãos de fé daquela senhora tratou de fazer o primeiro-socorro e chamar a ambulância de Resgate.

Meu final de ano começou assim, desastrado como os 359 dias anteriores.

Fiquei abalado com a cena. É muito difícil ser espectador de desastres. É vivenciar, praticar, o que sabemos na teoria: somos impotentes. A vida é imprevisível, incontrolável e acidental. Aquela senhora, fiel em sua fé, saindo de sua cerimônia, com as graças de Cristo renovadas, nunca poderia imaginar que estaria à mercê de um jovem inconsequente sobre uma moto sem placas.

Fico pensando se ela ainda acredita no que acreditava antes de tamanha dor e susto. Certamente, a sua festa de Natal, a ceia em família, a comilança anual de gostosuras, não aconteceu. Imagino alguém elaborando algum pensamento para dizer a ela, algo do tipo: Deus escolheu você para testar a sua fé. Agora é sua hora de mostrar força, se curar para no Natal deste ano e, com emoção, pregar aos irmãos em nosso culto de que Deus te provou, e prova todos todo dia, mas cabe a cada um exercer a sua fé.

Passado o Natal, a festa de Ano Novo, onde tudo correu bem, em harmonia, chegou a primeira segunda-feira do ano e com ela restabelecemos a rotina. Uma rotina triste como em boa parte do ano passado com a Covid-19 provocando mortes inesperadas de amigos próximos, pessoas que a gente estava acostumada a ver na padaria e se foi. A mesma batalha ideológica, idiota, em torno da vacina, não acabou. E, abestalhado, como o bordão daquele palhaço que foi eleito e reeleito deputado, vejo que o DataFolha identifica que 22% da população brasileira não quer se vacinar, 10% acredita que o Planeta Terra seja plano, 23% quer voto de papel… ou seja, o olavismo e bolsonarismo encontraram eco dentro de muitos dos meus irmãos brasileiros. Assim, pergunto: será possível um ano bom a todos?

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