“Em casa que falta pão, todo o mundo grita e ninguém tem razão”. Essa expressão é um provérbio português bastante usado quando uma situação está ruim, as pessoas se descontrolam e tomam atitudes erradas por não terem a base do sustento (o dinheiro) para raciocinar.
Assim está a política nacional, estadual e local neste momento de pandemia.
Primeiramente, o presidente quis dar o tom (vão trabalhar, é gripezinha, não precisa de isolamento…) e se envolveu numa novelesca crise que levou à demissão do ministro da Saúde, embate com governadores (especialmente o de São Paulo), defesa ferrenha dos seus seguidores. Até que o Supremo definiu que não é da esfera do presidente, mas dos governadores e prefeitos, a decisão sobre essa falsa polêmica: fazer ou não fazer isolamento.
Demorou algumas semanas para os apoiadores do presidente entenderem a prevalência da soberania dos Estados e Municípios sobre a vontade deles ou seu líder. E ficou clara a frustração deles todos. E partiram ao ataque contra as instituições. Foram ataques num grau crescente de agressividade até que o limite aceitável foi ultrapassado, o presidente retrocedeu e seus seguidodres mudaram o foco.
Tudo isso tinha um sentido quando os mortais, nas cidades onde moram, olhavam os ataques pelas rede sociais, canais de TV e rádio, jornais, whatesapp… Era algo distante. De personagens. Mas quando passa a ocorrer no mundo real, onde cada um mora, isso muda de figura, afinal de espectador o cidadão é chamado a ser participante.
Em Sorocaba, os vereadores (tem uma comissão para cada gosto, perfil ideológico, proximidade com a prefeita…) se orgulham de estarem fazendo o seu dever de casa; empresários estão certos de que pior do que a morte pelo CoronaVíru será a pela fome dos pobres e por isso eles, empresários, querem dar trabalho para seus funcionários. Há listagem de pessoas (uns dizem com 1200 assinaturas em Sorocaba) pedindo a flexibilização da abertura de atividades. Há o Ministério Público questionando a legalidade de uma lista divulgada pela prefeitura. Há a oposição endereçando à prefeita a responsabilidade pelas mortes que venham a ocorrer em razão da permissão por algum tipo de flexibilização no comércio.
Há, isso sim, dedos em riste para todo lado, afinal “em casa que falta pão, todo o mundo grita e ninguém tem razão”.
Há, isso sim, uma ansiedade com as contas que começam a chegar e, sem receita, obriga todos a pegarem suas reservas.
Há, isso sim, um latente e crescente medo: aguento mais um mês!
Há, isso sim, uma decepção em pagar impostos evidenciando uma clara negação do papel do Estado na sociedade.
Vozes do apocalipse propagam: “você viu algum político falar em corte de mordominas e despesas?”
E a voz da classe média, no silêncio do seu isolamento, pressiona prefeitos e governadores com gritos de libera, flexibiliza, deixa abrir…
E a voz do letrado desafia: como se cria anticorpos ao Covid19 se todos continuarem trancafiados?
E aqueles que já estavam abandonados, mas conseguiam fazer uma refeição por dia no Bom Prato, se vêem agora nas calçadas, sem uma mesa digna para se alimentar. Como diz um amigo, é absurda a situação na rua dos Andradas, ao lado da Igreja São Lucas, na área central de Sorocaba, onde as pessoas fazem filas para pegar o marmitex, comem nas sarjetas e largam sujeira nas calçadas. Uma imagem deplorável, me relata ele.
Classe média, no silêncio do seu isolamento, pressiona: libera, flexibiliza, deixa abrir…
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