O Palmeiras é o campeão brasileiro 2022 desde a tarde de quarta-feira passada quando o Internacional perdeu para o América MG.
Mais do que o futebol jogado pelo time, o interesse das pessoas está concentrado no trabalho do técnico português Abel Ferreira. Ele foca seu discurso no caráter de cada jogador. Cada um deles foi convencido que ao se comprometer com o jogo coletivo, que é, afinal, o futebol, deixando de lado o aspecto individual, o sucesso viria.
No que diz respeito ao Palmeiras, isso está dando certo há dois anos. São títulos pra lá de importantes como duas Libertadores e agora o Brasileirão. Na prática isso quer dizer jogadores, técnico e comissão com os bolsos bem cheios.
É possível, por analogia, transferir o sucesso do Palmeiras para a sociedade. Mas isso seria farsa, assim como é farsante esse discurso de Abel Ferreira.
A imprensa esportiva, historicamente com baixíssimo senso crítico, vende a ideia de que o sucesso do Palmeiras se dá pelo blá-blá-blá de Abel Ferreira.
Traduzindo: O técnico português propaga a ideologia da meritocracia. A imprensa assina embaixo sem reflexão alguma.
O técnico diz que o time é vencedor (o que por analogia poderia se supor que qualquer time, pessoa, sociedade… também poderia ser) por cultivar o predomínio (numa sociedade, organização, grupo, ocupação etc…) daqueles que têm mais méritos (os mais trabalhadores, mais dedicados, mais bem dotados de disciplina para fazer o que lhe é determinado e etc…) para se comprometer com o projeto, no caso de Abel, de time, mas poderia muito bem ser aplicado na firma, na empresa, numa organização qualquer.
Não é bem assim…
Meritocracia é ideologia, e, por conseguinte, como qualquer ideologia, serve aos interesses de quem é dominante (uma classe social, por exemplo) e aos seus compromissos institucionais, organizacionais e, especialmente, políticos. Sistematicamente, a meritocracia também funciona como instrumento de alienação. É o que se vê a cada vitória e título do Palmeiras, a cada novo investimento do time, a cada peça mexida como parte de um planejamento.
Veja o exemplo de Endrick. Ele tem apenas 16 anos, se tornou titular da equipe profissional e está vencendo na vida. No caso dele (e de milhares de crianças que sonham em jogar futebol para tirar a mãe e irmãos da miséria) o que se comunica é: Sim, é possível… Basta querer… Ele chegou ao sucesso graças ao seu mérito e “você” também pode ser caso seja tão dedicado quanto…
É essa a mensagem que Abel dá e a imprensa a cada novo gol de Endrick, a cada entrevista sobre o garoto ter os pés no chão, sobre a humildade do time, sobre o sucesso do técnico, sobre a supremacia do Palmeiras…
Não é bem assim…
Subliminarmente, e simultaneamente, há também outra mensagem, tão poderosa quanto a primeira: Trabalhe, muito. Se esforce, muito. Se dedique, muito… Então você também terá sucesso. E se não tiver e “fracassar” a culpa é sua que não fez muito. Veja o Endrick. Ele fez, conseguiu e até os seus colegas de time profissional reconhecem isso a ponto de lhe darem de presente um par de tênis de 9 mil reais. Aqui abro um parênteses e confesso: Não tinha ideia de que um par de tênis (qualquer sapato) pudesse custar 9 mil reais… Certamente a culpa é minha e da minha ausência de mérito.