Desaprender a nadar

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Nunca tinha vivido a experiência de ter pensado em algo, a princípio tão absurdo e sem sentido, e tempos depois alguém não apenas ter pensado a mesma coisa como também ter colocado em prática tal ideia. 

Falo tipo das “maluquices” do desenho animado The Jetsons (décadas de 70 e 80) tão comuns nos dias de hoje (século 21). 

Pois acabo de ler na BBC (https://www.bbc.com/portuguese/articles/cld7l16lxz9o) que está criada a pílula anticoncepcional masculina sem hormônios, onde uma proteína impede o espermatozoide de nadar, ou seja, após a ejaculação ele não chega no ovário.

E vou dizer, um dia eu já havia tido essa ideia, quando tinha apenas 17 anos, entrando na faculdade. Evitar filho era uma preocupação verdadeiramente urgente. Estávamos em meados dos anos 80. Era a década seguinte à da Revolução Sexual que havia se iniciado no final dos anos 60. A pílula, unicamente feminina, naquela época e ainda hoje, tão cheia de hormônios, é um mal à saúde do corpo e mente. Camisinha não era algo comum como é atualmente.

Aquela geração, de homens e mulheres, lidava com a culpa do sexo, especialmente quando alguém ficava grávida. Ninguém queria procriar. Todos queríamos descobrir o corpo, se conectar a ele, se conectar e tocar o corpo do outro.

Essa questão significava não um rompimento com os dogmas e crenças religiosas, embora muitos assim tenham procedido, mas conciliar a tradição de sua fé e prática de uma religião (no meu caso a Católica e depois o Espiritismo, Ubanda, deuses indianos…) com o exercício dessa curiosidade. Viver nessa contradição ou romper com a religião eram as alternativas. Ficar sem sexo, não. 

Me lembro de uma talentosa aluna que escondeu a gravidez enquanto pôde, então ela abandonou o curso e o pai do bebê mudou para o noturno abandonando a militância política estudantil da qual ele era expoente.

Outros casos, abortos. Se falava muito de uma colega que teria feito ao menos três. Ela entrou no jogo de fazer de conta que não falavam dela e sobreviveu.

Havia, ainda, as relações homossexuais, muito escondidas naquela época, e todas masculinas. A homossexualidade feminina não fazia parte do contexto. Não, ao menos, com o atrevimento que se desenhava entre os homens.

Havia política, drogas, economia (do fracassado Plano Sarney)… mas o  sexo era a temática dominante.

Foi nesse ambiente, de energia e curto-circuito de hormônios, num dos vários momentos em que ficávamos sentados em pequenas rodas (algo que não mais existe, ao menos não na intensidade daqueles anos, nos tempos de redes sociais), que me ocorreu dizer algo do tipo: Bem que podiam ensinar o espermatozóide a desaprender a nadar… 

Lembrando disso, vejo novamente o instante em que meu amigo Carlos Magno caiu na gargalhada, se divertindo com minha “ideia”, e um outro cara, mais velho, ator de teatro, cujo o nome me escapa, me dizendo: Como você fala merda. Nesse caso, ele estava errado. Mas foram necessários 40 anos, a partir dessa notícia da BBC, para se saber disso.

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