Tempo de cores

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Além do açougue no Paredão da Light, meus pais tinham um bar no cômodo da frente de casa e durante toda a Quaresma um ovo de chocolate gigante (arrisco dizer que tinha 5 quilos ou mais) ficava exposto no balcão. 

Ele era a prenda da rifa, mas eu não tinha idade para compreender o que era isso. Era um ovo colorido, além de gigante. Era lúdico. Eu só conseguia olhar. Ele ficava tão no alto que eu não conseguia pegar.

Até que um dia, acordava, e o ovão tinha ido embora. Não me lembro da abertura da cartela e de nenhum ganhador. E nem de ficar triste. 

Um traço que meus pais deixaram a nós, seus filhos, foi o da resiliência, o de aceitar o que nos acontecia, de não lamentar ou choramingar. O que está feito, está feito. Portanto é seguir pedalando. 

Não lembro de nenhum outro ovo de Páscoa. Não havia o frisson que vejo hoje de se comprar e presentear os filhos com o ovo de chocolate. O que não quer dizer que não existisse, apenas que não me lembro, pois em se tratando de doce, eu sempre preferi o pudim que minha mãe fazia todo domingo. Todos, sem exagero. Não era pudim de leite e nem de padaria. Era um muito mais gostoso que levava queijo parmesão ralado. Nunca me enjoei dele e, também, nunca mais vi algum igual. Nem receita.

Nada disso quer dizer que a Páscoa era uma data qualquer. Bem ao contrário. O Domingo de Páscoa era, literalmente, o início de ano em casa. O senso comum diz que o ano começa depois do Carnaval, mas em casa não. Principalmente do ponto de vista estético. As cortinas e janelas ficavam abertas (era uma casa de esquina) e toda luz possível invadia cada canto. Os vasos voltavam a ter flores. Minha mãe pintava as unhas de vermelho. Ninguém mais me repreendia para “falar baixo”, “não gritar”. Tudo era menos tenso e mais colorido.

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