Influenciador de antanho

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Eu ainda era bem criança quando soube que, apesar de meu desejo, eu não seria jogador de futebol. 

Numa peneira no Estrada, promovida por olheiros (não se usava o termo empresário no início dos anos 70), suponho eu, pois não era coisa do clube, pela primeira vez tive que mostrar minhas habilidades com a bola percorrendo um circuito de cones que ia de um lado ao outro do campo. Fiz o necessário, mas com um esforço, com tanta dificuldade, que aquilo me constrangeu. Ainda assim, ao final da minha série, nutria um fio de esperança de ser escolhido.

Mas ao final da série de todos, me senti insignificante diante da facilidade com que se desempenharam Denílson José de Melo, Rogerinho, Hélio (todos viraram jogadores profissionais, pois já eram craques aos 10 anos).

Mesmo assim segui amando jogar bola. É assim que dizíamos e não era preciso explicar, pois ninguém jogava basquete, vôlei, tênis…

Me lembro de um dia ter chegado em casa um dia no final da tarde, todo suado, e encontrado em casa meu tio Mingo, que morava em São Bernardo e era ligado aos bastidores dos times de futebol, conversando com o meu pai na sala. Ele era casado com uma das irmãs do meu pai que estava na cozinha conversando com a minha mãe. Me lembro dele dizer: Você gosta de jogar bola? Então tem que ter preparo físico. O futebol virou força. Acabou aquele negócio de Pelé, Rivelino, Ademir da Guia, Pedro Rocha… Eu não entendi muito bem suas palavras, mas captei o sentido. Foi o jeito carinhoso dele me dizer, um gordinho e desajeitado desde sempre, que “minha carreira” estava no fim. Meu pai, sobre isso, ficou em silêncio.

O ápice da “minha carreira” no mundo do futebol foi ter sido gandula no CIC para os jogos do São Bento – mas essa é uma outra história. 

“Minha carreira” se deu no que eu gostava e interessava: falar sobre e dos jogos. Eu gostava mais de ver os repórteres trabalhando do que o jogo em si. Então eu puxava assunto com Gílson Ribeiro, Roberto Cabrini (esse mesmo que segue na TV), Luís Andreolli, Luiz Henrique Gurian…

Minha maior emoção, certamente, foi ter assistido Osmar Santos narrando o jogo entre São Bento e Corinthians. Ele usou uma cabine do lado oposto aos das cadeiras cativas. Ele jogava junto. Ficava em pé, sem camisa. Uma lenda. Era fã.

Me lembro de minha mãe me dando dinheiro toda segunda-feira para eu comprar “A Gazeta Esportiva”. Depois de ler o jornal, eu recortava as fotografias mais expressivas e colava num caderno.

Na hora do almoço, era sagrado ver o programa de esportes na TV Cultura. Estou certo que o Globo Esportes foi criado devido a importância desse programa. Lá estavam Luiz Noriega, José Carlos Ciccarelli e João Zanforlin.

E eu me lembrei de tudo isso porque aos 75 anos de idade Zanforlin morreu nesta segunda-feira. Estava com problemas de saúde, foi internado e a família comunicou o fato na hora do almoço. 

Eu estive com Zanforlin em duas oportunidades quando eu fui editor do jornal Bom Dia e cruzei com ele nos corredores do escritório de J.Hawilla em São Paulo. Em nenhuma delas pude pará-lo para dizer o quanto havia de influência dele no que eu havia decidido fazer da vida.

Zanforlin se tornou referência como advogado esportivo, uma especialidade rara. Se tornou respeitado e admirado.

João Zanforlin Schablatura era seu nome completo e de batismo. Ele nasceu em Timburi e iniciou sua carreira na Rádio Piratininga de Piraju, se tornou especialista em direito desportivo e como narrador e comentarista cobriu oito Copas do Mundo (1970 a 1998), além de sete olimpíadas (1972 a 1996). Seu corpo foi velado, na manhã de hoje, no Cemitério da Vila Alpina, na zona leste da capital de São Paulo.

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