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Um senhorzinho, mirrado, de cabelos brancos e volumosos, de calça social, camisa e sapato passo doble, foi atendido no Cartório Renato, onde foi pedir a certidão de um imóvel.

Um funcionário, estou certo que é adolescente ainda, vestindo calça jeans, camiseta e tênis, malhado, entrou no hall e chamou seu nome. E o senhor, prontamente, num tom entusiasmado e juvenil disse: Esse cara sou eu.

A expressão não fez sentido para o jovem. Então ele explicou: Esse refrão deu até música… Nada, nenhuma reação do jovem funcionário.

A música, se você é também jovem, é sucesso de Roberto Carlos…

O jovem, educado, demonstrava atenção ao senhor e ouviu dele: Quando muito jovem, como você, também fiz este tipo de atendimento neste mesmo cartório, igual você.

O menino sorriu. Um sorriso amarelo. Essa é minha interpretação. Ele não sabia como entabular a sequência da conversa.

O senhorzinho, essa é minha interpretação, já estava acostumado aos assuntos que ele sabe conversar não ter ressonância em seu interlocutor. 

Gerações extremas de poucos significados em comum estavam frente a frente. 

O jovem tinha pressa e o senhorzinho todo tempo do mundo. Paradoxo! Pois pela lógica o jovem tem muitos anos, já o senhorzinho…

Possivelmente este encontro no meio da tarde, absolutamente profissional, tenha sido sua única interação neste dia. Saindo dali teria novas intermináveis horas, solitário.

Passada meia-hora, um pouco menos, um homem entrou na sala do cartório e se dirigiu à recepcionista dizendo: Encontrei esta carteira no estacionamento e lhe entregou o objeto que tinha em mãos. 

Tinha dinheiro dentro? A pergunta assustou o homem que disse, apressadamente, que não tinha mexido em nada. Eu achei no chão e vim entregar, disse ele, saindo para encerrar a conversa. 

A recepcionista abriu, viu o nome no documento e me disse, já que eu acompanhei tudo, é do senhor que estava aqui. Eu só asenti com a cabeça. Ouvi ela falando ao senhorzinho, quando lhe telefonou, que sua carteira havia sido encontrada.

Chegou minha vez de ser atendido e fiquei pensando na sorte dele, de tão boa alma ter encontrado e devolvido sua carteira. O quanto tal ato livrava o senhorzinho de transtornos. 

Mas, me veio a mente esse pensamento: E se ele perdeu a carteira intencionalmente.  Só para garantir novas oportunidades de interação social. Só para amenizar todas as horas que lhe enchem de um vazio que beira o insuportável. 

Mas isso é apenas fruto de minha imaginação, evidentemente. Ninguém perde a carteira ou qualquer outra coisa intencionalmente.

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