O cartunista argentino, Joaquín Salvados Lavado, mais conhecido como Quino, morreu aos 88 anos nesta quarta-feira. Ele é autor de uma das mais conhecidas personagens de ficção, traduzidas em mais de 35 países, e que me tocou de um modo particular quando eu ainda era apenas um adolescente: Mafalda.
A personagem é uma criança de 6 anos que coloca a inocência da sua existência a serviço de perguntas óbvias a respeito dos valores humanos o que significa cutucar as ações da política, a estrutura do racismo, o comportamento das pessoas.
Mafalda (e Calvin, a outra tirinha de jornal de minha preferência) trata de temas que sempre foram muito caros a mim. Uma vez foi perguntado ao escritor Julio Cortázar o que ele pensava da Mafalda e ele respondeu: “Não importa o que eu penso da Mafalda. O importante é o que a Mafalda pensa de mim ”. O que significa que ela se tornou o espelho para se olhar. Pensar como a Mafalda – ou pensar como pensamos que a Mafalda teria pensado – tornou-se hábito. Mas, repito, para mim.
Vejo que Mafalda não significa nada para a geração de brasileiros que hoje está na faixa dos 20 anos. Um amigo, que estuda essa questão de geração e o seu comportamento, me diz que o índice de aprovação de Bolsonaro e o amontoado de besteiras que ele fala e faz não se sustentaria apenas entre os homens que estão acima dos 50 anos, com a vida financeira resolvida, e que é a nova geração, a que cresceu nos anos do PT, que se reconhece e se vê nele. “Meu governo está realizando ações sem precedentes para proteger a Amazônia”, disse o presidente hoje, na manhã seguinte ao debate entre os presidenciáveis dos Estados Unidos. Apenas essa geração, que não lê e não se vê em Mafalda, diz muuuuuuu (onomatopéia do gado) a uma fala tão mentirosa do presidente.
A morte de Quino me lembra o quanto estou deslocado do mundo, estou anacrônico. Sinto uma espécie de compaixão desses jovens que “sustentam” a popularidade do imbecil do presidente e uma grande raiva do PT que governou o país onde frutificou essa geração. A raiva que sinto do PT é a mesma raiva que sinto do governo militar, ambos “destruíram” a educação pública de qualidade a ponto de terem patrocinado “a geração Bolsonaro”.
Acho que Mafalda concordaria com esse raciocínio.