Dia do Trabalhador 

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O bar que meus pais tinham na esquina das ruas Moreira Cabral e Souza Moraes, na Vila Santana, estavam no auge de movimento de clientes em 1973, quando eu tinha 6 anos de idade.

Não me lembro quem, mas alguém sugeriu que eu engraxasse os sapatos dos fregueses. Pode ter sido uma iniciativa minha, uma vez que a caixa de engraxar estava em casa, mas pode também ter sido ideia de alguém. Minha mãe não gostou da ideia, disso me lembro. Meu pai torceu o nariz. O fato é que engraxava e aquilo me deixava feliz.

Não eram só as moedas que me davam satisfação, moedas e notas que eu juntava a semana inteira e ia num bazar da esquina das ruas Hermelino Matarazzo e Piratininga, bem perto do Cemitério da Saudades, e comprava um carrinho de ferro que eu olhava na vitrine a semana inteira antes de entrar e me decidir pelo qual ia levar. O que que me deixava feliz era ver um sapato sujo ficar brilhando pelas minhas mãos. 

Não durou muito tempo esse serviço. E quem colocou fim nele foi minha mãe. Depois de eu entrar chorando em casa. Um gaiato pediu que eu lhe engraxasse as botas. Ele explicou como queria, me lembro bem. Eu passei um pano molhado no couro e quando secou passei graxa incolor. Deu muito mais trabalho, mas o resultado foi impressionante. Um brilho e tanto. Então, o freguês disse que não ia pagar. Ele disse que não tinha gostado do resultado. Ele me deu um tapa na cabeça e me mandou parar de encher, que ele não me devia nada. Eu fiquei num misto de decepção e raiva. E entrei chorando em casa. Minha mãe tirou a caixa de engraxar de mim, caixa essa que era do meu nonno se não tiver enganado e ficou de herança para o meu pai. 

Décadas depois, um dia quando ia buscar minha filha na escola, me deparei com aquele homem que não me pagou por eu ter engraxado suas botas. Ele era o bedel. Fui puxar papo com a intenção de saber se ele se lembrava de mim como eu dele. Não se lembrava. Como diz o ditado, quem bate esquece, quem apanha, não…

Tive outros muitos trabalhos nesses 55 anos de vida. Um ou outro também recebi calote. Mas nem por isso deixei de fazer o meu melhor. Sempre fiz como se fosse para mim. Não é esforço, apenas meu jeito.

Nos últimos tempos tenho pensado em empreender. Não fui educado para isso. Das poucas coisas que meu pai me disse, uma me marcou: Trabalhe e seja honesto. 

Um dia, horas depois de ter sido demitido de um emprego, fui na casa dele, como sempre ia. Três, quatro vezes na semana. E me surpreendeu a sua pergunta naquele dia: O que você fez de errado? Tempos depois soube que ele foi no empregador que me demitiu querer saber o que eu tinha feito de errado. Na época me ofendi. Hoje eu entendo que sua desconfiança não era comigo, mas com o sistema. Para ele, bastava não fazer nada errado para não ser demitido. Sabemos que não é assim. Mas ele não sabia.

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