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Fui ao circo Stankowich no sábado à noite e gostei das duas horas entretido com as dançarinas, malabaristas, equilibristas, quatro motociclistas dentro do Globo da Morte, os trapezistas e suas piruetas nas alturas, as mágicas e, meu preferido, o palhaço. Ele aparece quatro vezes ao longo do espetáculo. Interage com muita competência e graça com o público.

Ainda não foi desta vez que subi ao picadeiro para ajudar o palhaço em suas estripulias. Espero por isso desde criança.

Mas quase… A escolhida foi uma moça na fileira onde eu estava sentado, três posições ao meu lado. Ela estava tão perto que lhe perguntei se o palhaço havia combinado antes com ela e ela me disse que não, que ficou surpresa quando foi chamada.

Eu não me convenci completamente de que tenha sido realmente isso. Sempre acho que “os escolhidos” não são aleatórias pessoas do público. Mas nunca me dediquei a descobrir se é isso mesmo. 

Eu gosto de circo desde sempre. Tenho na memória que minha primeira vez foi uma ida em família. Não me lembro do circo nem vagamente, mas me lembro de tão cansado, na volta para casa, à noite, de minha mãe me pegar no colo, já perto de casa. Naquela época, nem transporte público havia em variados horários. O jeito era fazer a pé o que se desejava.

Quando tinha 8, 9, 10 anos eu já ia sozinho ao circo. Eles se instalavam num terreno onde foi construída uma praça no encontro (não é cruzamento) das ruas Miguel Sutil e Bartolomeu de Gusmão. Eram circos pobres, mambembes. Nada comparado ao Stankovich, esse é de superprodução, onde gente senta em cadeiras, não numa frágil arquibancada de madeira. 

Me lembro de ter passado todas as tardes num dos circos ali instalados. Fiquei sensibilizado com o elefante… Sua tristeza era proporcional ao seu tamanho. Uma argola presa numa de suas patas tinha uma corrente cujo a outra extremidade era presa num toco de madeira fincado no chão. A corrente era opressora. Sua força era dominar o pensamento de quem olhasse para ela.

O elefante era mudo. Olhava apenas para um ponto. Era quase uma estátua. Alguém me falou que elefante gostava de amendoim, mas não aquele. Consegui um pouco no armazém do seo Salvador e chegava a pôr na boca do elefante o amendoim com casca, mas nada… 

Eu passava muito tempo olhando aquele elefante não fazer nada e tive a impressão que um dia ele me olhou. Eu pulei de alegria como se tivéssemos ficado amigos. E corri dizer ao tratador: Ele me viu… ele dirigiu seu olhar pra mim…

E daí, ele não é cego, saia daqui, você está atrapalhando… O tratador era bruto, não só comigo, mas com o elefante também.

Esse circo foi embora sem que eu tivesse assistido um único espetáculo, pois eles eram à noite e eu tinha de estar em casa antes de escurecer. Eu sempre achava que ia ver “meu amigo” em cena e me bateu uma culpa quando cheguei um dia, como toda tarde, e só vi o terreno vazio…

Não sei se é generalizado, mas não são mais permitidos animais em circo. Foi a forma encontrada para combater os maus-tratos pelos quais passavam. Se houver circo com animal, certamente seu proprietário recebeu autorização após comprovar as boas condições de cuidados dos bichos.

Me lembro de outro circo, do palhaço Pinduquinha. Todo mundo falava que ele era irmão da Alice, a vizinha de casa na Vila Santana. Eu o vi um dia na casa dela, sem maquiagem. Era apenas um homem, não havia palhaçada nenhuma. Nem legal ele era.

Circo sempre me desperta a melancolia. Talvez do colo da minha mãe naquela volta pra casa…

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