Quando a faxineira chegou e, sem dar bom dia foi logo me perguntando, esperando não ser decepcionada: O senhor comprou desinfetante né?!
Não me restou outra opção a não ser sair de casa e atender a sua necessidade para fazer seu trabalho da forma decente de sempre…
(Na fila do caixa, no mercado do Jardim Tropical, uma mulher pagava enquanto conversava com a funcionária quando me interessei pelo assunto. Dizia ela (…) a minha menina está dando um baile para ficar na escola, ela agora está indo pela primeira vez… O menino está no nono ano… A do caixa, mais velha, disse: A melhor coisa é quando eles vão e deixam a gente um pouco em paz. Dá pra respirar… Dá raiva quando a diretora chama a gente lá porque eles (filhos/alunos) aprontaram alguma… Só nesta hora, e olha lá, mães como a do caixa vão à escola como se cuidar do filho fosse apenas responsabilidade de professores, diretores…
A freguesa não disse nada, mas teve que ouvir a conclusão da outra: A escola é chata…
Não é, pensei comigo. Talvez seja, pensei comigo. A culpa é da escola, pensei comigo. Não, é de mães, como a do caixa, pensei comigo.
A escola é necessária. Sem ela, todo dia a roda precisaria ser inventada. É na escola que aprendemos o que alguém inventou ou descobriu ou elaborou ou consertou ou construiu…
É na escola que praticamos valores que aprendemos em casa, na família, o primeiro núcleo de qualquer cidadão.
É na escola que testamos nossa capacidade de lidar com a hierarquia de autoridades.
É na escola que exercitamos a tolerância com os diferentes de nós (família) na cor da pele, na origem da família, na fé e crença religiosa.
É na escola que a sociedade se molda. Não só dentro da sala, onde existe a mediação profissional entre o conteúdo curricular determinado pelo governo e as crianças e adolescentes que chegam para aprender o que outros já sabem faz tempo, mas no pátio, nos corredores, nos locais de lanchar, nas ruas de acesso. É aí que acontecerá o primeiro beijo e a forma como cada um vai lidar com sua libido; que o primeiro cigarro será oferecido e então teremos testada nossa capacidade de se manter incluído e dizer não; que alguém vai tentar vender sua maconha e depois outras drogas; é onde se tomar o primeiro gole com a turma… É aí que o “mundo” acontece… O protagonismo de cada individualidade, sem a proteção de mãe ou pai ou avós, floresce. É aí que cada um está por si. Só!
Fugir disso é se alienar das possibilidades que apenas a escola oferece. É impedir o acesso ao futuro sonhado. É se apartar. Não dá para pensar numa sociedade sem núcleos de vivência e convivência. Nascemos e “aparece” a mãe, depois se reconhece o pai, irmãos, tios… Então os vizinhos. Daí a igreja, a escola, o clube, o time. Aí é hora de trabalhar, casar e dar continuidade ao ciclo que faz a sociedade como ela é. Igreja e clube, em muitas famílias, já não é parte deste ciclo. Mas eu não consigo imaginar que a escola seja eliminada. Ela, em si, é boa. Não há dúvida! Na escola particular, onde vejo senão a totalidade, pelo menos quase ela, os alunos estão privados do que acontece do lado de fora dos muros, pois chegam e partem dentro dos carros da família.)
…Então cheguei em casa. Comprei um desinfetante da marca Omo de 900ml e outro sem marca, cor de rosa choque, de 2,5 litros. O Omo custou quase 10 reais e o outro quase 6 reais. A faxineira, quando lhe entreguei os dois, me disse, cheia de conhecimento, pegando apenas o Omo: O senhor jogou dinheiro fora, não deveria ter comprado esse aí..