O pior mal é aquele ao qual nos acostumamos…
Essa frase, atribuída ao filósofo existencialista Jean-Paul Sartre “pulou” na minha timeline do Facebook na tarde de sexta-feira e me fez sentido.
São dezenas de publicações que passam pela minha frente e não foi por acaso que prestei atenção nessa, especificamente. Houve um bom motivo.
De manhã, na saleta de espera para dar o horário de entrar no recinto da piscina onde faço hidroginástica puxei conversa com a única pessoa que estava ali, uma mulher, faixa dos 40 anos, olhos puxados à japonesa e não a nenhum outro país do extremo oriente. Não sei o motivo, mas sempre acerto a nacionalidade de descendência da pessoa em questão quando me proponho a fazer essa distinção. Os japoneses, chineses, coreanos são muitos diferentes, embora o senso comum (preconceito) das pessoas diga o contrário.
Comecei perguntando se ela já havia estado no Japão e ela me disse que não, mas enfatizou que tem vontade de ir… a passeio. Seu tom de voz frisou o a passeio. O que me fez indagá-la: Não quer ir para trabalhar? (foram milhares de descendentes que foram trabalhar no Japão nos últimos 30 anos) E ela respondeu: Ahhh, é muito rígido. Lá se trabalha 12 horas por dia sete dias na semana. É bom para ganhar, economizar e voltar para gastar aqui. Quando se tem disciplina é bom, mas eu não quero isso pra minha vida, ela me disse.
Quando pensava em encerrar o assunto, já que estava dando a hora de entrar na piscina e outros sócios do clube começaram a ocupar a salinha de espera, resolvi falar da tragédia da manhã de sexta-feira (horário do Brasil) onde um homem construiu uma arma de fogo e matou com um tiro o ex-primeiro-ministro japonês que estava em campanha política para ser reeleito ao mesmo cargo. Então após alguns comentários ela disse com clareza: Esse crime é mais chocante porque lá não tem crime, não é como aqui que todo dia umas 50 pessoas são assassinadas (sic)… É mais de 50 por dia. É mais que o dobro. (O Japão tem 125 milhões de habitantes e registrou 32 mortes por armas de fogo ao longo de todo o ano de 2020, segundo o Small Arms Survey. O Brasil tem 212 milhões de habitantes e registrou 39 mil homicídios por arma de fogo em 2020, ou seja, uma média de 40 mortes por dia, segundo o Fórum de Segurança Pública.
Confesso, fiquei estupefato com a simplicidade com que ela falou isso.
Me senti ofendido. É como se ela dissesse que o Japão é civilizado e o Brasil, não.
Então entramos na aula, saímos, fiz minhas coisas e ao me deparar com essa frase de Sartre que abre esta postagem, me vi enfrentando o óbvio: Nós, brasileiros, estamos acostumados com a morte.
Este (des)governo contribui muito para isso, mas seria injusto responsabilizá-lo totalmente por essa realidade. Ela vem de décadas e, como tantas outras coisas, fruto da falta de educação, de empatia e do abismo social e econômico em que também nos acostumamos a viver, como se fosse normal.