Feliz aniversário

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Me surpreendi ao saber que um meu amigo está completando 70 anos de idade. 

Não é pouco. Até bem pouco tempo atrás, era muito. Agora, não. Ultrapassar os 90 anos de vida é algo que será corriqueiro e não exceção. 

Nesse contexto de pensar na idade do meu amigo, e na minha também, obviamente, recebi uma brincadeira de uma amiga, onde teria de escolher entre uma pílula vermelha e outra azul. 

Tomasse a vermelha e eu regrediria no tempo para corrigir os erros que cometi nos meus 55 anos, 11 meses e 17 dias de existência. 

Tomasse a azul, receberia uma bolada de 10 milhões de dólares para gastar onde e com o que quisesse.

Escolhi a azul. Ela me disse que a maioria escolheu a vermelha e me perguntou se eu não me arrependo do que fiz. Eu disse que não fiz nada que 10 paus não consertassem… Rimos. 

A segunda-feira seguiu e me dei conta que eu seguia pensando na brincadeira e… na resposta da maioria.

Eu fui hipócrita. Eu queria que algum dinheiro fosse o suficiente para corrigir do que me arrependo. Mas não é. Nem todo o dinheiro do mundo seria.

A primeira bobagem que fiz, se houve alguma anterior eu não me lembro, foi me omitir de falar a verdade. Eu tinha 9 anos, estava na 3° série e na volta do recreio alguém na sala de aula acusou o sumiço de uma borracha. A dona Claudete, ou seria Valdete?, iniciou uma acareação. A situação saiu de controle e a culpa recaiu sobre o Geraldo, um menino negro, mais velho, conhecido por ser repetente, o que era a pior marca que uma criança podia ter. Eu sabia quem tinha escondido a borracha. Eu sabia que não era o Geraldo o autor daquela malvadeza. Eu sabia e me omiti.

Anos depois. Muitos. Eu já era jornalista e me encontrei com o Geraldo. Ele era assessor de um político importante. Nossos olhares se cruzaram e ele me fuzilou como se dissesse: Eu conheço o seu passado. Eu me envergonhei. Fiquei constrangido. Mas nem assim tive coragem de lhe pedir perdão. O evento acabou e nunca mais nos encontramos.

Quando eu tinha 17 anos, ouvi de um colega que ele havia ido numa festa. E bebidas e fumaça depois transou com uma moça. E estava feliz com a sua aventura. Ao contrário do que eu havia feito na 3° série, dessa vez não me omiti. E contei à namorada dele, que era minha amiga, não apenas uma colega, o que ele havia feito. Ela terminou o namoro, mesmo apaixonada por ele. Talvez, se eu não soubesse do ocorrido, ela o tivesse perdoado. Sei que ela sofreu. Se eu tivesse me omitido, eles teriam se casado e sido felizes. Ela se casou três vezes e nunca se sentiu completa.

Fiz coisa pior do que essas, asseguro. Mas também não é aqui que vou fazer a confissão do meu “grande pecado”. Não tenho estrutura para anunciá-lo. Sim, um único grande, sucedidos de vários outros menores. Um que apenas a pílula vermelha, de voltar no tempo, seria capaz de corrigir. Dinheiro algum tem esse poder.

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