Há 40 anos, no dia 26 de janeiro de 1984, o Brasil amanhecia estarrecido com o fato principal da nação, ocorrido no dia anterior, ter sido ignorado pela principal emissora de TV do país. Ou seja, o Jornal Nacional da noite do dia 25 não noticiou que uma multidão, mais de 300 mil brasileiros, haviam se juntando na praça da Sé na capital paulista no que ficou conhecido como Movimento das Diretas Já. Noticiou como se fosse a festa dos 430 anos de São Paulo mostrando a presença de artistas e distorcendo a relevância do fato.
Os jornais e os outros canais de TV e as rádios noticiaram. A Rede Globo achou que se ignorasse o fato seria como se ele não tivesse existido. E se viu reduzida pela realidade. O movimento das ruas mudou a consciência dos gabinetes e depois dos sombrios anos de chumbo da ditadura militar o eleitor voltou às urnas tendo, primeiramente, que engolir o último presidente do voto indireto, mas primeiro civil depois de 23 anos, Tancredo Neves, morto antes da posse, o que garantiu o mandato de seu vice, Sarney. Collor ganhou no voto e foi cassado. Itamar Franco completou o mandato. Fernando Henrique Cardoso assumiu e com ele veio a estabilidade da moeda com a criação do Real, o fim da hiperinflação e a história recente com Lula, Lula, Dilma, Temer, Bolsonaro e Lula novamente.
O poder da TV se derreteu com o domínio do universo virtual sobre as mentes, mas ainda existe. A cultura é digital. A informação é qualquer coisa. Qualquer imbecil é emissor. E quanto maior a imbecilidade que propagar maior é sua audiência. É o universo da pós-verdade. Os fatos se tornaram obsoletos e a opinião ganhou valor. Vacina faz mal, gritou o presidente no cercadinho do seu Palácio, e o remédio para fungo faz bem… Uma horda de súditos deu reverberação e a dúvida ganhou força. A Ciência foi negligenciada e os súditos apoiaram…
A burrice venceu!
Não é culpa da democracia. Não é culpa do Movimento Diretas Já. Não é culpa da tecnologia. É da seguida manipulação de alguns e da burrice de muitos. São vítimas, mas mesmo assim idiotas. Há muito o que ser feito para a consolidação da democracia. Esse deve ser o compromisso da sociedade. Democracia não tem cor partidária.
Mas, como um dia escreveu o estadunidense Aldous Huxley, autor de O Admirável Mundo Novo: “A maioria da população teme a responsabilidade de escolha e tudo o que quer é que lhe digam o que fazer. Desde que os governantes não interfiram no seu conforto material e nas suas crenças mais queridas, está tudo bem e feliz deixando-se governar.”
Eu tinha 14 anos de idade no movimento das Diretas Já. Eu participava do grupo de jovens da Igreja Santa Rita, do movimento Convergência da Juventude Socialista, do Interact Club. Eu andava com operários, filhos de ricos, de delegados, professores, empresários. Eu estava bem encaminhado pelo Senai, onde eu estudava, para ser metalúrgico primeiramente e, se eu quisesse, subir para alguma diretoria da indústria. Mas eu não temia a responsabilidade e nem ninguém dizendo o que eu deveria fazer. Minha luta sempre foi pela liberdade de atitude. Por cada um fazendo escolhas sem se deixar manipular.
Uma luta em vão?