Metáfora da Porsch

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A propaganda da indústria automobilística e de suas concessionárias, quando se trata de carro esportivo, centra sua mensagem em algumas capacidades do referido veículo, mas em especial no quanto tempo o carro faz na aceleração. Tipo alcançar 100km/ em meros 2,7 segundos. De fato, é quase a velocidade de um foguete.

Emoções e essa velocidade prometem adrenalina para o motorista que foi educado a gostar de carro, sua potência e o status que associado a tais fatores. No caso brasileiro, esse gosto sempre foi da cultura masculina, embora isso, claramente, esteja mudando nos últimos tempos. Mas é cultura, ou seja, é um gosto que passa da família para o filho(a).

Me lembro disso tudo porque no sábado, no pior trecho da rodovia Castello Branco, sentido Sorocaba a São Paulo, logo após o pedágio, entre os km 78 e 68, onde os caminhões se acumulam nas faixas da direita e central e não raro também na da esquerda, vivi uma experiência com um desses carros.

Neste trecho da rodovia é necessário paciência ao motorista “comum”, “normal”, pois sobra, quando sobra, a faixa da esquerda para os carros 1.0, 1.4, 1.6 e também as Suvs  2.2, 2.8, 3.0. É um momento de tensão também, onde os diferentes precisam se respeitar para não se acidentarem.

Neste trecho, sábado, pelo retrovisor, vi uma Porsch esportiva (creio que era o modelo 911), lá de longe, costurando de uma faixa para outra. Aquele pequeno carro rasteiro, o que chama ainda mais a atenção numa época de carros altos, parecia grudado no asfalto. Parecia um carro de videogame. Ele deslizava como uma nave, suave, parecia espacial.

O motorista da Porsch, numa velocidade alta para as circunstâncias, suponho que no mínimo 120km/h ele estava pois eu estava a 80km/h, tentava avançar pela faixa da direita quando, do nada, um caminhão da faixa central foi para a direita. Senti um frio na barriga. “Vi” a Porsch entrando embaixo daquele caminhão… quando ela simplesmente parou. O motorista brecou e a Porsch desacelerou de 100km a 0k em 0 metros. Impressionante!

Talvez a propaganda não atraia compradores se o argumento for de que o carro breca. Talvez!

Confesso que minha adrenalina subiu vendo isso tudo.

Nos segundos seguintes, a Porsch retomou sua aceleração exaurindo o barulho turbo e me peguei lembrando da novela “Carinhoso”, de 1972, quando eu tinha apenas 5 anos de idade. Além da música tema da novela, de Pixinguinha, me lembro de situações marcantes da trama. Uma delas era Regina Duarte dividida em seu amor por entre as personagens de Cláudio Marzo, todo certinho, e seu irmão Marcos Paulo, o rebelde aventureiro que tinha uma Porsch. Um enredo certamente inspirado no filme Sabrina, dos anos 50, que teve refilmagem nos anos 90 com Harrison Ford.

A Porsch voou e seguiu em suas costuras, não havia obstáculos para aquele motorista, e o que comecei a ver pelo retrovisor agora via na minha frente até que na linha do horizonte, uns bons quilômetros adiante, ela saiu de meu raio de visão.

Uma metáfora da vida!

Uma maioria apenas numa sobrevivência letárgica enfrentando um momento difícil do trajeto e aquele que pode comprar uma Porsch.

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