Nos dias quentes, abafados e de chuva como os atuais, nos anos 70, na esquina das ruas Moreira Cabral com Souza Moraes, a parede da casa dos Buturri (cujo a fachada atual ilustra essa publicação), que tinha dois janelões que nunca se abriam, quando o Sol se punha e as lâmpadas dos postes se acendiam, era tomada por uma revoada de içá, mariposas e outros insetos.
Dentro das casas, os siriris entravam por qualquer fresta e a estratégia era colocar embaixo da lâmpada, raras eram as casas com lustres, uma bacia de alumínio, bem ariada, um espelho, com água. O siriri vendo aquela luz mergulhava e morria na água. Siriri perdia suas asas, o que deixava uma sujeira, e virava cupim de madeira. Lembrando que todas, ou a maioria, das casas tinham assoalho de madeira e um pequeno porão embaixo, o que ajudava a refrescar o ambiente.
Eram tantos insetos!
A gente convivia bem com eles, pois faziam parte da vida das pessoas, então nunca se pensava: De onde eles vinham. Seria como se a gente pensasse: De onde viemos? Perguntas sem sentido algum para quem crescia para ser gente grande (não se usava o termo adulto).
Do mesmo modo, ninguém se perguntava de onde vinham os pardais. Eles estavam no meio de nós. A sinfonia de seu canto, nos finais de tarde, ensurdecedora, pois era milhares, nos pertencia. Então, igualmente, não fazia sentido perguntar de onde vinham tantos pardais.
Hoje, ao contrário, fazer essa pergunta é urgente pois os pardais sumiram. E a resposta para isso ter ocorrido é elementar: os içás, siriris, mariposas, os alimentos dos pardais, foram dizimados pelo fim das áreas verdes (o que não virou moradia, virou fábrica ou rua) e abusivo uso de agrotóxicos e ondas eletromagnéticas, celulares e outras. Logo as abelhas estarão extintas e com elas, em consequência, o mel.
Assim vamos nos adaptando. E se desistir, se cansar, perder o interesse, a ruína é certa. A opção é estar apto para o que nos é oferecido. É preciso querer, desejar, buscar, lutar, pedalar… É preciso buscar um sonho, além do de ter virado gente grande.
Alguém com esse espírito, se aproveitando do sumiço dos similares dos içás e siriris, inventou o ChatGPT, a inteligência artificial que escreve de sonetos a teses, de redação escolar a romances… em segundos. “Obras” que devem fazer algum sentido para pessoas do tipo que compram ovo já frito em bandeja nos mercados.