Quando vítimas de maus tratos precisam ser afastadas da família…

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A implantação do Programa Família Acolhedora, que consiste no acolhimento temporário de crianças e adolescentes afastados do âmbito familiar por medida de proteção, foi debatida em audiência pública da Câmara Municipal de Sorocaba na manhã desta segunda-feira, 6, por iniciativa do vereador Fernando Dini (MDB), presidente da Casa, em parceria com a Secretaria de Igualdade e Assistência Social. Presidida por Dini, a mesa dos trabalhos foi composta pelas seguintes autoridades: secretária de Igualdade e Assistência Social, Cíntia de Almeida; promotora da Infância e Juventude, Cristina Palma; e defensora pública Gisele Ximenes.

Preparando a lei

“Políticas públicas de qualidade só podem ser feitas dessa maneira, com a participação de diversas instituições, como estamos vendo nessa audiência pública”, afirmou Fernando Dini na abertura dos trabalhos. A secretária Cíntia de Almeida explicou que será apresentada à Câmara Municipal a minuta do projeto de lei que cria o Serviço de Acolhimento Familiar em Sorocaba e lembrou que, em todo o país, há cerca de 46 mil crianças em acolhimento, a maioria em organizações da sociedade civil. A secretária ressaltou o trabalho de sua equipe no sentido retomar a ideia de criar o programa, que, segundo ela, já deveria ter sido implementado há mais tempo, dada a sua importância para as crianças e adolescentes.

Ministério Público

A promotora pública Cristina Palma explicou que o Programa Família Acolhedora já está previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e consiste no acolhimento de crianças e adolescentes que, em virtude de maus tratos, abusos sexuais e outras formas de violência, precisam, para sua própria proteção, ser afastadas da família e levadas para um abrigo. “Todos os tipos de família podem se cadastrar no programa, colocando-se à disposição para acolher um desses menores de idade que devem ser retirados de sua família”, afirmou, observando que poucas cidades contam com o programa no Estado, entre elas, Campinas e Santos. A promotora enfatizou, ainda, que o ideal é trabalhar na prevenção, através da rede de proteção social, para que as crianças não cheguem à situação de precisar de acolhimento.

Defensoria Pública

A defensora pública Gisele Ximenes disse que as “instituições totais”, como os antigos orfanatos, com dezenas e até centenas de crianças, não eram boas para as crianças, tanto que, atualmente, os abrigos não podem ter mais de dez crianças. “Hoje, a casa de acolhimento tem de imitar ao máximo uma família, mas, na prática, por mais que a instituição siga todas as orientações técnicas, com toda estrutura e uma equipe mínima, nada é igual a estar numa família. Por isso, em nome da Defensoria Pública, viemos pedir à Câmara Municipal a aprovação desse projeto de lei que institui o Programa Família Acolhedora”, enfatizou a defensora pública.

Importância do afeto

A chefe de seção da Proteção Social Especial, Fabiana Corrêa, observou que o Programa Família Acolhedora tem como arcabouço legal a Política Nacional de Assistência Social, o Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa do Direito de Crianças e Adolescentes e o próprio Estatuto e da Criança e do Adolescente. Para participar do programa, os interessados precisam ter acima de 21 anos e podem integrar qualquer configuração de família, dispondo de renda para sustentá-la. O programa prevê uma ajuda de um salário mínimo por criança acolhida, podendo ser um valor maior em caso de criança com deficiência. O acolhimento é temporário e só ocorre quando não foi possível resolver a situação da criança por meio da rede de proteção social.

Fabiana Corrêa citou pesquisas que mostram a importância do acolhimento familiar. O psiquiatra britânico John Bowby, autor da Teoria do Apego, procurou mostrar as implicações para a vida adulta dos fortes vínculos afetivos entre o bebê e o provedor de segurança e conforto. Pesquisa da Universidade de Harvard constatou que o abandono na primeira infância pode causar danos neurológicos às crianças. E o estudo que ficou conhecido como “Órfãos da Romênia”, realizado com criança de orfanatos romenos, durante a ditadura de Nicolau Ceausescu, também detectou a dificuldade de desenvolvimento e socialização dessas crianças. “Há cada ano que a criança fica institucionalizada, ela perde quatro meses de seu desenvolvimento. A criança que se encontra em situação de afastamento da família já sofreu uma privação. A família acolhedora não apenas minimiza esses danos como também garante cuidado individualizado”, afirmou Fabiana Corrêa.

Projeto de Campinas

A coordenadora do serviço de acolhimento familiar Conviver, de Campinas, Erika Cristina Ferraz, discorreu sobre o programa campinense, que funciona há 13 anos e já atendeu mais de 120 crianças, priorizando o atendimento na faixa etária de zero a seis anos. Após discorrer sobre o modo como o programa é desenvolvido, com acompanhamento sistemático das famílias por parte da equipe do programa, Erika Ferraz observou que, atualmente, há 17 famílias acolhedoras em Campinas, atendendo 16 crianças, e quatro famílias em estudo. “É um número pequeno em relação ao tamanho da cidade, mas não queremos quantidade e, sim, qualidade nos atendimentos”, observou. A pedagoga do Conviver, Silvia Regina, também discorreu sobre o programa.

Também esteve presente à audiência pública o casal Marjorie e Miguel Santa Maria, uma família acolhedora de Campinas. “Falar de família acolhedora é muito emocionante. Estou muito feliz. Com amor a gente muda a vida. Mostramos para essas crianças que elas vieram ao mundo para serem amadas. Acolhemos uma criança que tinha medo de tudo e, quando saiu de nossa casa, ela não tinha mais medo”, contou Marjorie, ao falar sobre sua experiência e a de seu marido como família acolhedora, a pedido do presidente da Casa, Fernando Dini, no encerramento da sessão, após os questionamentos dos presentes. “Podem ter certeza que iremos nos esforçar ao máximo no sentido de aprovarmos essa lei, para que o processo continue sendo apreciado e acompanhado pelas demais instituições envolvidas”, afirmou Dini, ao final dos trabalhos.

A audiência pública foi transmitida ao vivo pela TV Câmara (Canal 31.3; Canal 6 da NET e Canal 9 da Vivo) e pode ser vista no portal da Casa.

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