Fausto Silva é das figuras públicas mais importantes da minha adolescência e, ao lado de Osmar Santos, figura pública importante para a decisão tomada, ainda muito jovem, de trabalhar com comunicação. Juntos, nos idos de 1983, se eu não estiver enganado, eles comandavam o programa Balancê na extinta Rádio Excelsior (AM 720 Khz) – foto – na hora do almoço e eu, aluno do Senai, ficava grudado no radinho de pilha. Mais do que os convidados, gostava deles, dos improvisos, da energia que o rádio transmitia.
Depois Fausto Silva foi ganhando fama com o programa Perdidos na Noite e há 20 anos ou mais com o Domingão do Faustão, mas é aquele Fausto que fazia par com Osmar Santos que sempre gostei. O Domingão via, um pouquinho, quando ia visitar minha falecida mãe, essa sim assídua telespectadora. Mas mesmo sem assistir ainda gosto de Fausto Silva por dois móvitos: um quadro que ele tem para indicar livros ao seu público. Sim, o livro de papel além do seu conteúdo, mas sua forma, é um exercício para o desenvolvimento do cérebro. Nem ele, e sua imensa audiência, conseguiu fazer o Brasil um país de leitores. O outro motivo: ele nunca abandonou J.Hawilla quando esse foi preso em razão dos crimes de colarinho branco no futebol mundial. Me lembro de várias segundas-feiras, quando eu ia à Traffic em São Paulo em razão de reunião do jornal Bom Dia, ver Faustão encostar seu carro (ele dirigindo) e deixar J.Hawilla. Habitualmente eles almoçavam juntos. Alguém viu Fausto demonizando Hawilla?
Por que digo isso tudo?
Relembro tudo isso porque é absolutamente oportunista e injustificável o uso que contrários e simpatizantes do presidente Bolsonaro fizeram de uma fala de Fausto Silva veiculada na edição do Domingão do Faustão de ontem: Sem citar nomes, o apresentador falou sobre “um idiota que está ferrando com todo mundo” e “novos ares” após a atriz Sophie Charlotte , de Ilha de Ferro, defender a Amazônia e o Carnaval brasileiros.
“O brasileiro, na hora do Carnaval e na hora da seleção, nós sabemos muito bem, é um povo que tem união, tem solidariedade, tem uma integração. Por que isso não acontece nas coisas sérias?”, questionou o apresentador.
“Lutar pela educação, por saúde pública, contra a corrupção, contra a incompetência, que é uma forma de corrupção. O imbecil que está lá –e não devia estar– pode até ser honesto, mas é um idiota que está e está ferrando com todo mundo. Você paga imposto, o que você recebe? Vamos ver se esses novos ares vão mudar, tem que rezar para dar certo”, completou o apresentador.
A possibilidade de o recado ser destinado ao presidente empossado Jair Bolsonaro alçou rapidamente o nome de Fausto Silva ao primeiro lugar dos assuntos mais comentados no Twitter. No Facebook e Whattsapp foi instaurada uma verdadeira guerra entre os prós e contras Bolsonaro. Quem demonizava a Globo até outro dia passou a propagar a fala do apresentador. E quem passou a demonizar agora a Globo (adoravam na época do impeachment) via na fala apenas a confirmação de que a emissora é comunista (sic).
O fato é que o quadro Pizza do Faustão foi gravado ainda no ano passado, quando Michel Temer ainda era presente.
Mas a verdade pouco importa. O que vale é a versão, seja de um lado ou outro. Por isso, digo: as reações à fala de Fausto Silva ajudam a sociedade a entender o momento que ela vive. Triste momento, afirmo. O ser algo ou o ter algo – que durante décadas foi o que valeu e importou – deu espaço para o parecer. Ou seja, não importa o que você é ou tem, mas o que parece ser ou ter.