Na marginal Tietê, começo da tarde de sexta-feira, com Sol forte, tempo seco e quente, na contramão, atrapalhando o trânsito (como diz a música do Chico) um senhor e um jovem, imaginei pai e filho, empurram um pesado carrinho de madeira com restos de papelão, plástico, ferro e três crianças em cima com idades entre 3 e 5 anos. Um motorista desvia o caminhão deles e puxa o tráfego à esquerda dando passagem, e certa segurança, para o esforço daquela família.
No posto de gasolina na esquina da rua Guaipá com a avenida Imperatriz Leopoldina, ainda na sexta-feira, mas já perto das 22h, a temperatura despencou perto dos 18 graus, um homem com galão na mão implora por um pouco de gasolina. Uma criança de no máximo 3 anos está grudada na perna dele. Um rapaz, numa T-Cross branca, novinha, se comove e lhe paga 5 litros. O homem joga a criança pra cima celebrando. Quando a menina desce, abraça apertado o pescoço do pai. E ele, mostrando os dentes, comemora: Vamos conseguir ir embora filha! Seu carro, ou o que um dia foi um Monza, está atulhado de coisas que certamente ele vai conseguir transformar em algum dinheiro.
Nas duas cenas, tão comum a cada ida minha à capital, me chama a atenção a sujeira que envolve essas pessoas. Eles não têm mais cor. Seus corpos estão imundos. Mas quanta dignidade exalam! No carrinho de madeira ou no carro velho, ambos estão trabalhando. Em cima do carrinho de madeira ou no colo do pai, as crianças estão cuidadas. Não como o ideal de cuidados para uma criança que seria o de brincar, dormir e comer. Mas no possível da realidade daquelas pessoas. Mas ainda bem que existem os homens limpos. Eleitos a cada quatro anos eles manipulam bilhões do orçamento secreto. Seus interesses pessoais, vendendo dificuldade para colher facilidades, estão fora de cogitação quando empunham o microfone e exalam empatia pelos homens sujos lhe prometendo um mundo melhor. Às vezes cometem “pequenos” delitos como o de deixar a inflação corroer o poder de compra esvaziando o carrinho no mercado; garantindo o lucro dos acionistas permitindo a explosão do preço no litro do combustível; adiando a correção na tabela do imposto de renda tirando, assim, 27,5% de quem ganha 1,5 salário mínimo. Fora “lapsos” como esses, aos homens sujos resta a agradecer aos limpos pelo que fazem por eles.