Cada geração é chamada para melhorar o mundo. E não foi diferente com a minha.
Toda sexta-feira, com ou sem chuva, desde os 7 anos, quando entrei na primeira série do hoje chamado Ensino Fundamental, na EE Professor Genésio Machado, na rua Miguel Sutil, na Vila Santana, havia o chamado culto à pátria quando os alunos ouviam no alto falante o Hino Nacional, pois pouquíssimos ou nenhum sabia o hino e, com certeza, nenhum entendia o significado de sua letra. Aliás, ainda hoje não entende.
Eu fiz 7 anos em 1974 e saí em 1981, diplomado na 8° série. Já era um grande feito naquela época, pois nem todos colegas conseguiram terminar.
Meus sete anos no Ensino Fundamental foram sob a égide da Ditadura Militar. O que significou seguir a cartilha da hierarquia e obediência ao conteúdo organizado pelo ministério. Eram raros os professores que se atreviam a pensar, imagina então falar, sobre o que estava acontecendo. Mesmo assim, há momentos marcantes. Um deles, na aula de Geografia, o professor Nelson manteve a calma quando uma aluna não entendia o que havia depois de Vladivostok, cidade portuária da Rússia que faz fronteira com a Coréia do Norte e China. Essa cidade, para quem nunca jogou War, era icônica do ponto de vista da estratégia para se ganhar a guerra/jogo. E o professor Nelson delicadamente tirou o mapa de papel dependurado na lousa e uniu as pontas para nos lembrar que a Terra é redonda. Certamente os terraplanistas não tiveram aula com nenhum professor Nelson.
Aquele rito de toda sexta-feira, o rito a ser seguido na missa (naquela época a maioria se dizia católica), o rito da família (raríssimas mães trabalhavam fora de casa) nos davam um único recado: Vivemos em grupo. Somos uma comunidade. Temos uma pátria. Nosso papel é constituir família. Nossa liberdade individual era a de pertencimento ao todo.
Olhando com os olhos de hoje, o Brasil era feliz? Não. Era uma Ditadura.
O “povo” era educado para servir e não se atrever a fazer nada que não fosse autorizado. O ensino era voltado para o filho do pobre aceitar a sua condição de trabalhar sem reclamar. Todos se dizem católicos porque era a “religião oficial”. Ser de alguma religião de origem africana, por exemplo, era uma afronta e os vizinhos tratavam de “gelar” o subversivo. Ser do MDB era um atrevimento numa cidade conservadora como Sorocaba, sendo de bom tom dizer que os pais votavam na Arena. Ninguém dizia o que sentia e se precisasse dizer algo, então se dizia que estava tudo bem… E quem subvertesse isso, sofria represálias. Essa semana, gravações das ações dos militares começaram a se tornar pública. E não é nada agradável o que se ouve ali.
Me lembro do diretor Jaime Germano e do professor Edvaldo Queiroz gritando para todos naquelas sextas-feiras: Vocês são responsáveis pelo futuro do Brasil.
Aos poucos, ano após ano ouvindo esse mantra eu passei a me sentir de fato responsável pelo meu país.
Agora, quando eu estou prestes a completar 55 anos, quase meio século depois de ter entrado no Ensino Fundamental, me pergunto onde falhei. Pois esse país é um fracasso. Caro. Dividido. Amargurado. Inseguro. Apesar de alguns seguirem se dando muito bem, comprando, pagando as contas, comendo e bebendo em casa e nos restaurantes. Aos outros muitos resta o que? Quem tiver uma boa resposta, favor me dizer.