“O Último Grito” é daqueles livros surpreendentemente bons porque ele dá a ideia desde as primeiras linhas, confirmando as informações da orelha e contracapa, de que vai tratar de um assunto e no final ele está abordando outro.
Não se trata de um realismo fantástico, tipo Dom Quixote, muito menos de algo da estirpe de Garcia Marques ou Juan Rulfo, mas na tradição estadunidense do realismo, Thomas Pynchon cria um universo bem particular entre o suspense dos livros policiais, citações da cultura pop da TV e música de seu país e a paranóia típica do novayorkino.
No caso, o assunto é o ataque às torres gêmeas, mundialmente de conhecimento de qualquer pessoa. É o mundo da Internet, da deepweb. É a surpreendente previsão do surgimento das redes sociais e do quanto ela dominaria a mente humana por meio da junção Internet e celular (que na época em que o livro foi escrito eram ainda os tijolões e de acesso a poucos). O assunto é também o terrorismo e o quanto o capitalismo retroalimenta não apenas essa que é uma ideologia, mas também é um sistema de organização social com as consequências individuais e de suas relações entre pessoas.
Mas se esse é o assunto aparente do livro, na essência ele segue em outro rumo e trata de quem vê esses assuntos de dentro dele, porém sem serem os protagonistas de seus desdobramentos. Trata da mãe, dos filhos, marido, amiga, conflitos conjugais, relacionamentos amorosos. Trata da família como núcleo capaz de oferecer bons momentos a quem consegue formar uma.
Da primeira à última linha, nas mais de 500 páginas, acompanhamos Maxine. Em qualquer outro livro ela seria a heroína óbvia. Neste aqui, não. Ela é mãe, esposa, amiga e ainda assim a investigadora perita nos crimes fiscais que se desenrolam na indústria de computadores, fibras e dados a partir da disseminação da Internet. É apenas alguém que trabalha. É a cicerone a uma Nova York conhecida através do cinema, da literatura, do turismo, do noticiário.
“O Último Grito” não é apenas um livro de entretenimento recheado de referências, é também uma confissão de fé na família e amizade.
Cheguei no livro por toda bajulação que o marketing promove em torno do autor. Mas não me arrependo, ao contrário, gostei de ter lido.