Jair, o sem compaixão

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Na primeira vez que fui sozinho ao cinema eu tinha 9 anos, acho, e fui ver King Kong no extinto Cine São José. Para quem não a conheceu, era uma sala gigantesca, como eram os cinemas de antigamente, mais de mil lugares, balcão, pé direito de uns 50 metros ou mais. Me sentei na primeira fila, tela gigante, não dava quase para assistir direito. Mas quando dei conta, estava vidrado na história e tentando esconder meu choro dos meus amigos. A cara do King Kong triste, depois de vencido, me partiu o coração.

Foi a primeira vez que chorei num filme. Hoje, quem me conhece, sabe que sou uma manteiga derretida. Eu sei que são personagens, portanto não existem, são invenções, mas mesmo assim eu sinto a sua dor. Até a minha adolescência eu tentava esconder esse meu sentimento, afinal homem não chora.

Foi em 1985, aos 17 anos, no primeiro ano de faculdade, morando em Campinas, eu tinha uma amiga que tinha um amigo que fazia ilustrações para alguns trabalhos de Rubem Alves, então no auge de sua carreira acadêmica na Unicamp, que passei a entender o que acontecia comigo e aprendi que eu era normal. Através desse amigo da minha amiga passei a frequentar algumas aulas e palestras de Rubem Alves, o filósofo brasileiro. E foi em suas aulas, e num fanzine que ele fazia, chamado “Sabor e Saber”, que descobri que havia um nome para este meu choro e que não havia nada de errado com ele. Trata-se de compaixão, ou seja, o sentir a tristeza do outro.

Escrevendo este texto, fico pensando se alguém me ensinou esse sentimento ou ele é uma daquelas coisas que nasce com cada um. Igualmente, fico pensando se é possível alguém desensinar um outro, que tem compaixão, a não tê-la. Rubem Alves, acreditava que era possível tanto uma coisa como outra desde que houvesse o que ele chamava de Pedagogia da Tristeza. Ao menos, eu interpreto assim seu livro “O patinho que não aprendeu a voar” e seu conto “Ensinando a Tristeza”.

É graças a Rubem Alves que dou um desconto ao Jair, sim, o presidente. Ele é tão duro, tão frio, e descobri isso quando de seu voto pelo impeachment da Dilma ao ele enaltecer um torturador e somente depois vi a série de outras falácias dele que apenas confirmaram essa sua característica. Ele se porta e comporta como se homem não chorasse. Ele se comporta como o soldado do exército que ele é. Qualquer filme de guerra mostra a necessidade de um soldado militar ser durão. E Jair imita esse estereótipo.

A partir de agora passo a me dirigir diretamente ao presidente da República. Jair, me perdoe, você não é mais militar e nem do exército. Você é presidente. Você pode ser espontâneo. Você não precisa dizer que é mimimi meu, e de outros milhões de brasileiros, a dor que sentimos pela tristeza de quem perdeu uma entre as mais de 270 mil vidas já ceifadas por esta pandemia, sendo 2.349 apenas nas 24 horas entre os dias 9 e 10 de março. Te lembro, que muitas dessas mortes, a maioria, acredito, ocorreram graças a sua inoperância no comando do Estado brasileiro no que diz respeito a várias coisas, mas neste momento, a de conseguir apaziguar os males trazidos pelo Coronavírus.

Mimimi, que é o que você diz que estou sentindo, significa não sentir a dor do outro, ou seja, é o antônimo de compaixão. Não sinto mimimi algum, Jair. E, te lembro, o que se espera de um líder civil Jair, que é o que você é, é essa empatia, essa compaixão, esse estar no lugar do outro. Vamos Jair, mostre que você é capaz desse sentimento. Só ontem foram 2.286 vidas perdidas para a Covid-19 e você não sentiu nada. Apenas, envergonhadamente, colocou máscara num evento público. Para os petistas, você fez isso graças ao puxão de orelhas que o Lula lhe deu. Para mim, você fez isso por imposição do Estado de Israel de onde seu filho e seu chanceler chegaram no dia anterior e lhe contaram um pouco do que pensam de você.

Meu desejo Jair, é que, mesmo tardiamente, você faça o mínimo que está ao seu alcance, ou seja, agilize a partir de agora vacinas e leitos a todos os brasileiros. E que chore pela dor dos outros. Ao menos algumas lágrimas, desde que não sejam de crocodilo. E que você discurse aos seus fanáticos para que eles parem de distorcer a realidade na guerra empreendida nas redes sociais. Vamos Jair, você consegue!

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