O fim da Padaria Sabina é a crônica de uma morte anunciada

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PadariaSabinaEstava no ar com a coluna O Deda Questão na manhã de hoje no Jornal Ipanema (FM 91.1Mhz) quando se confirmou a desastrosa decisão de Carlos Eduardo Martin Ciarella, o filho mais velho do saudoso seu Orlando (que está vivo, mas afastado do operacional da empresa há anos devido a sérios problemas de saúde) e da dona Sabina, de demitir os 120 funcionários da sua padaria com um aviso na porta, pedindo que eles se dirijam na próxima sexta-feira, dia 5, às 15h, num salão de eventos munidos da Carteira de Trabalho. Supõe-se que terão o acerto das contas exigidas por lei. Mas não é certeza uma vez que ações judiciais, penhoras e leilões pelo qual a padaria vem sendo alvo nos últimos cinco anos faz-se supor que não exista dinheiro para honrar o que devem aos trabalhadores, ou seja, o que é direito de cada um previsto na legislação.

O fim da Padaria Sabina me faz lembrar do livro “Crônica de uma morte anunciada”, escrito pelo prêmio Nobel de Literatura Gabriel García Márquez, publicado em 1981, e que conta o último dia de vida de Santiago Nasar. Não tenho a pretensão de fazer a reconstrução da Padaria Sabina, e muito menos de imitar Gabo (apelido de infância do escritor colombiano). Mas, em seu livro-crônica, ele reconstrói jornalisticamente o último dia de vida de Santiago Nasar, assassinado sem chance de defesa, através da superposição das versões de testemunhas que estiveram próximas ao protagonista. A morte de Santiago foi premeditada (daí o título do livro), assim como o fechamento da Padaria Sabina vem sendo, pelo acúmulo de dívidas e execuções judiciais há cinco anos pelo menos.

Gabo critica a cultura colombina (onde está a essência das suas histórias e personagens) que permite ao autor de um assassinato premeditado uma pena irrisória.

Por similaridade, o fechamento da Padaria Sabina, com um cartaz na porta pegando os 120 funcionários de surpresa, tem o mesmo teor do que é criticado por Gabriel Garcia Márquez, ou seja, assim como foi premeditada a morte de Santiago no livro, o encerramento da padaria Sabina, da forma como foi, também foi premeditada uma vez que os funcionários trabalharam normalmente até a véspera de Ano Novo. Por isso pergunto: que penalidade terá Carlos Eduardo por fazer o que fez? Ele já-já vai abrir uma nova padaria, com novo nome, em novo endereço.

O início – sucesso

Fundada em outubro de 1986 pela família Ciarella, sendo patronos o casal Orlando Martin Ciarella, e Maria Sabina Galheira Martin, e os filhos Carlos Eduardo e Fernanda, a padaria tornou-se em pouco tempo referência e exemplo de confeitaria inovadora, graças à visão de futuro e dedicação da família.

A loja ficou pequena para atender ao crescente público e comportar tanta variedade de produtos, surgindo então a nova sede em 1996, situada na Av. Pereira da Silva 1400, Santa Rosália Sorocaba, onde esteve até o fechamento da manhã de hoje.

A Padaria Sabina sempre estampou o orgulho de ter iniciado a mudança de conceito de padaria em Sorocaba sendo um local em que famílias iam até lá para um brunch, café da manhã, almoço, happy hour e até a sopinha da noite. Um leque de serviços que levou ao Sabina Gourmet, restaurante que atendia desde o almoço até recepções fechadas como casamentos, batizados, chás de bebês e cozinha, eventos de empresariais, como treinamentos e confraternizações, aniversários, etc…

Nos enche de alegria ao ter a certeza do trabalho reconhecido, quando nossos clientes sentem vontade de “comer uma coisa diferente” e é a nós que eles lembram e procuram, estampou em seu site os donos da padaria.

O meio – dívidas

Da padaria no bairro de Santa Rosália, a família decidiu expandir em meados de 2012 e abriu a Sabina Wanel Ville num prédio de arquitetura tão imponente quanto ao endereço onde ficou até o fechamento de hoje. A empreitada foi levada adiante pelo filho, que assumiu o controle da empresa. Carlos Eduardo, a essa altura, já enfrentava problemas para honrar pagamentos e se viu nas mãos de bancos o que levou a uma bola de neve crescente.

Em 19 de abril de 2017, apenas para dar um exemplo, foi a leilão da Justiça Federal num processo por Execução de Titulo Extrajudicial (nº0007293-82.2012.4.03.6110), movido pela Caixa Econômica Federal contra a Panificadora Sabina Ltda, 1 Forno elétrico Universo modelo Etna VE 9/3, avaliado em R$ 25.000,00; 1 Forno elétrico Universo modelo Etna VE 6/3, avaliado em R$ 18.000,00; 1 Massaira Ferri com capacidade para 50 kg de farinha, avaliado em R$ 15.000,00; 100 Cadeiras importadas em madeira e couro, avaliado em R$ 400,00 cada, totalizando R$ 40.000,00. No 1º leilão o lance mínimo foi de R$ 98 mil e no 2º o lance mínimo de R$ 49 mil.

São dezenas de ações, execuções e leilões dessa natureza contra a Padaria Sabina, ou seja, uma morte anunciada.

O Fim – desrespeito

Diante da história da padaria, mais especificamente da dona Sabina, pessoa de tamanha generosidade e simpatia e que emprestou o seu nome ao empreendimento, o que menos se imaginava era a demissão de 120 chefes de família por um cartaz. Mais que isso, a incerteza de que eles vão receber o que a lei garante a eles, ao menos na teoria.

O padeiro Luís Roberto Pelle, que trabalhava na unidade há 20 anos e chegou ao local às 3h10 da madrugada deste primeiro dia útil de 2018, para um novo dia de trabalho, foi chocante ser dispensado por um cartaz: “Eu sabia que alguma coisa ia acontecer, a gente estava vendo que a padaria estava ruim das pernas, não pagava ninguém, mas não pensava que eles iam fazer isso com a gente, que pelo menos tinham consideração com a gente. Eu trabalhei Natal, Ano Novo, ralei pra caramba aqui e não recebi vale e nem salário. Comecei com eles na outra empresa, o que aconteceu hoje foi uma falta de respeito”.

A operadora de caixa Elisabete de Fátima Silva passou mal ao se deparar com a sua condição ao ver aquele cartaz. Que sentimento de ser tratada como uma coisa ao ver diante de si própria um tratamento como o dado pela direção da padaria!

A supervisora Maria Aparecida Medeiros, que trabalhava na padaria há 11 anos, conta que o descaso começou quando a empresa deixou de pagar o vale e a participação nos lucros referente a 2016: “ gente merecia que fosse feita uma reunião com os funcionários mais velhos de casa para dizer o que estava acontecendo realmente com a empresa. Não chegar hoje aqui e ser pego de surpresa. Foi uma grande traição da parte dos diretores da empresa”.

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