Eu estava na banca do Tuco, na feira de domingo, onde compro ponkan, laranja, maçã, caqui…, onde sempre encontro amigos como o Ubiratan, que presidiu o Ciesp; o Cezinha, baixista; o Marcelo do Conselho de Cultura… Estava distraído. Então fui interpelado grosseiramente por um homem que não conheço.
Aparentemente sua idade está entre 55 e 65 anos. Mas pode ser mais.
– Ora, ora, ora… se não é o jornalista-comunista… Está contente com o governo?
Senti um incômodo. Minha garganta secou. E num misto de ironia e soberba lhe devolvi o insulto no mesmo tom.
– Fascista… Pode não estar a maravilha que desejamos, mas melhor do que o desgoverno passado, do ladrão de joias e genocida, está.
Neste momento o Tuco interviu: Opa, opa, opa… Vamos comprar frutas pessoal. Vamos deixar esse assunto para lá.
A filha do meu agressor impediu que o pai se aproximasse de mim, dizendo-lhe algo que não ouvi, mas entendi pela resposta dele, grosseria, falando alto se dirigindo a ela.
– Não estou brigando filha. É como Corinthians e Palmeiras…
O homem ficou nervoso, gaguejando. Pensei que ele fosse ter um ataque ali na banca do Tuco.
Então ele deixou de falar com a filha e se virou pra mim: Não é?
Ele se referia as divergências políticas serem como os adversários do futebol. Então respondi, com raiva na voz:
– Não é. Corinthians e Palmeiras respeitam as regras, não armam ninguém contra a lei. Não atentam contra a democracia.
A filha levou o meu agressor embora. E o Eliel, que trabalha há anos com o Tuco, ambiguamente me perguntou: Algo mais?
Eu, mudo, olhei nos olhos de Eliel e ele riu, malandramente, dizendo se queria alguma outra fruta. Eliel é o típico sarrista.
No domingo, na segunda-feira, ontem, fiquei pensando: Quem sou eu?
Martin Buber, o filósofo do encontro, tem uma definição sobre o Eu que desde que a estudei, trinta e tantos anos atrás, me identifiquei. Diz ele que Eu sou o que penso que eu sou, somado com o que o outro pensa que eu sou, somado ao que eu penso que o outro pensa que eu sou. É complexo, mas somos a soma desses três pontos.
Entender que o governo passado foi danoso, por sua ideologia e incompetência, não dá direito a ninguém de me chamar de comunista. Especialmente eu não sendo um. Eu sendo tanto de outras coisas…
Um dos danos do governo passado? Ter instruído seus seguidores a agredir quem eles escolhem ser seus adversários. É uma tática do fascismo. Os seguidores de Olavo de Carvalho conseguiam entender pouca coisa e essa tática estava ao alcance deles.
A derrota nas urnas dessa ideologia fez bem ao Brasil no sentido de não piorar o que já estava ruim, mas não é suficiente para educar os burros, como meu agressor, a respeitarem quem pensa diferente deles.