Este é o João. Na verdade, eu decidi chama-lo de João. O importante aqui é sua condição e o que ela representa no contexto brasileiro e não expor este momento terrível da sua vida.
Ele fala, raciocina e se expressa como se tivesse 8 anos, mas disse que tem 13. É aterrorizante ver sua condição de abandono emocional. Ele pouco sabe do seu passado, inclusive desconhece o seu pai. A mãe disse que ele já está “grande” e precisa ajudar em “casa”.
João apareceu na rua Padre Luiz hoje no centro de Sorocaba. Há três anos, no mesmo horário, em passo neste trecho desta rua e nunca o vi ali. Ele está sem escola e a mãe lhe deu uma caixinha de balinha de menta para vender no semáforo. Mas ele foi “expulso” do local porque o ponto lá já tem “dono”. São crianças “empregadas” por um homem que chega de carro e dá os pacotes de pipoca doce ou mentox para eles venderem. No final, eles pagam pelo que venderam ao homem e ainda lhe dão algum dinheiro. Nem metade do valor recebido em cada venda fica com aqueles meninos.
João disse que não é muito esperto para vender. Ele não é rápido. Já perdeu muita bala de quem acelera o carro sem ele ter chance de receber ou pegar sua bala de volta. Na rua Padre Luiz, hoje, João disse que estava se dando bem. Quando nós conversamos, por volta das 13h20, ele já tinha ganhado suco de caixinha, coca-cola, coxinha. Me dei bem aqui, me disse João exibindo seus dois dentões brancos que destoam dos seus pés sujos como se há muito não visse uma água enfiados num surrado chinelo de dedo.
João sabe quase nada de onde ele veio; vive no desequilíbrio de um dia se dar bem e no outro não ter o que comer; sobrevive sem ser cuidado, ao menos cuidado como qualquer criança deveria; não se sente de lugar nenhum e isso ficou claro quando ele não quis me dizer onde nasceu, onde mora, onde estuda.
Se pudesse, queria ter algum tipo de poder para que João se sentisse pertencendo a algum lugar e fosse olhado por quem mora neste local e construa um futuro para que possa dar um passado a alguém. Mas minha potência se limita, pela enésima vez, a contar uma mesma história nos 8 anos deste blog. Que ao menos, quem sabe, ela sensibilize alguém com poder e potência para acolher os joãos que estão perambulando por aí.