Gladiadores, rodeios e a essência humana

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Assisti a todos os jogos da Itália na Eurocopa, até o pênalti final que lhe deu um título que não vinha desde 1968. É a terra dos meus nonos. Em 1974, quando eu tinha apenas 7 anos, lembro de meu susto ao ver no álbum de figurinha Romeo Benetti (como são de todos em casa com exceção do meu e irmãos que o cartorário registrou com tte no final), um meio-de-campo com o talento similar ao do Chicão que fez história na Copa de 1978 na Argentina quando entrou para “matar” os adversários.

E gosto de ver não apenas o jogo que ocorre dentro do gramado, mas como a torcida se comporta. E me chamou a atenção faixas com a frase Forza Azzurra (Potência Azul) e Gladiatore (Gladiador). Me lembrei do Coliseu de Roma, dos embates entre humanos até a morte para o deleite de milhares de pessoas que se deslocavam de suas casas apenas para este momento.

Então me lembrei das touradas, ainda muito viva em Madri, na Espanha.

E, evidentemente, me lembrei do projeto do jovem vereador Vinícius Aith (assumidamente bolsonarista), protocolado na Câmara Municipal de Sorocaba, que estabelece regras atualizadas para a realização de rodeios e provas equestres no município.

É a versão atual dos tempos romanos. Se no coliseu o cidadão se divertia vendo o sofrimento humano até a morte, neste século 21 o vereador propõe que o cidadão se divirta ao ver o sofrimento imposto ao touro.

Me impressiona que o tempo passe e o ser humano siga sendo o mesmo.

O projeto

Aith propõe obediência às legislações estadual e federal, com a exigência da apresentação do “Selo Verde” – Certificação Rodeio Legal – emitido pela Confederação Nacional de Rodeio (CNAR). O seu projeto prevê a proibição das provas de laço, vaquejada ou “pega do garrote”, sendo permitidas apenas as modalidades esportivas em que a integridade física do animal é preservada: montarias, prova de três tambores, team penning, work penning, cavalgada, hipismo, provas de rédea, cuatiano e rodeio em touros.

O vereador lembra que “a arrecadação dos eventos realizados em Jaguariúna e Barretos movimentam anualmente, em média, R$ 20 milhões e R$ 900 milhões, respectivamente, com públicos de cerca de 100 mil e 800 mil pessoas, sendo mais de 50% turistas, que em Barretos gastam em média R$ 2.345,00 em cinco dias de permanência na cidade, gerando renda aos setores de turismo, hotelaria, gastronomia, serviços em geral. Queremos unir a geração de renda, o lazer e a cultura, garantindo o bem-estar dos animais que irão participar das competições. O projeto é bastante detalhado sobre isso”, explicou Vinícius Aith.

Proibição dos rodeios

O projeto de Aith surpreendeu por ter sido protocolado, o que significa que ele terá de ser votado pelo plenário do Legislativo. Há três, na legislatura anterior, já se ouvia o zumzumzum nos corredores da Câmara sobre a volta dos rodeios em Sorocaba. Então, o ex-vereador e ambientalista Gabriel Bittencourt alertou que, com a vaquejada e o rodeio declarados patrimônio cultural nacional pelo Congresso, surgiam no país movimentos para revogar leis que proíbem o rodeio, como a que existe em Sorocaba por articulação dele e lei do então vereador Irineu Toledo.

Gabriel Bittencourt, em sua explanação, começou exibindo imagens de rodeios, entre elas a de um cavaleiro perseguindo um bezerro. “Muitas vezes, o bezerro morre, por conta de fratura na coluna cervical”, observou, enfatizando que essas imagens demonstram a crueldade com os animais que os rodeios representam.

O alerta de Gabriel de nada adiantou.

Abacaxi ao prefeito

Se os vereadores rejeitarem o projeto de Aith, a legislação vigente será a mesma que está valendo desde os anos 2000, ou seja, os rodeios seguirão proibidos.

Mas se os vereadores aprovarem o projeto autorizando que Sorocaba realize rodeios, quem terá um problema será o prefeito Manga pois ele terá de sancionar (fazer valer) ou rejeitar. E qualquer que venha a ser a sua decisão, terá comprado uma briga gigante para o seu futuro político. O ideal, para ele, seria não precisar enfrentar este tema.

FOTO: Mosaico romano mostrando um gladiador lutando contra uma fera.

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