Um Sonho: continua o apaixonado debate sobre o grafite em parede de patrimônio sorocabano e seu sentido, moral, ocupação. Enfim, suas relações. Até o MP entrou nessa

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Entrevistei o promotor de justiça Jorge Marum na coluna O Deda Questão no Jornal da Ipanema (FM 91,1Mhz) na manhã desta quarta-feira (16/08) para saber detalhes de sua ação em torno do grafite de Panmela Castro na parede “cega” do Palacete Scarpa. A obra faz parte da Trienal de Artes do Sesc que prossegue até dezembro em Sorocaba e já está incorporada ao acervo do Museu de Arte Contemporânea de Berlim na Alemanha. Ela desperta repugnância em parcela da sociedade que vê na imagem uma genitália feminina (leia postagem, anterior sobre este tema), virou tema dentro da Câmara de Vereadores e agora chega ao Ministério Público.

Quando fiz minha primeira postagem sobre o tema, comecei com a pergunta: o que você vê nessa imagem? E o promotor Marum foi um dos que comentou o link, dizendo: “Eu vejo a degradação de um patrimônio histórico”.

Sem ter sido provocado, ele confirmou isso na entrevista de hoje, mas agindo de ofício, como se fala, o promotor entendeu que diante de toda a repercussão na mídia desse tema merecia uma investigação, “não do ponto de vista do meu gosto pessoal, muito menos se o grafite é arte ou o aspecto moral contido nele” – frisou o promotor – mas do ponto de vista do que diz a legislação do patrimônio histórico.

O grafite fere a lei? O secretário da Cultura, Werinton Kermes, foi categórico em dizer que não ao autorizar o grafite na parede. O secretário lembrou que ela fica na parede “cega” do prédio (e uma pesquisa no Google, básica, mostra que historicamente sempre se valorizou as fachadas do prédio, não havia ate o grafite uma única foto dessa tal parede “cega”) e o tombamento é de grau 2, ou seja, a preservação deve ser da fachada, arabestos, adornos e afins. Argumento do qual o promotor concordou na entrevista de hoje, mas fez a ressalva de que “a lei fala em fachada e em torno das fachadas, portanto uma investigação sobre o grafite no edifício é plausível”.

Vale lembrar que o Palacete Scarpa é considerado um dos mais importantes patrimônios históricos da cidade e um dos cartões-postais de Sorocaba. O prédio tem estilo arquitetônico neoclássico e evidencia linhas greco-romanas em sua fachada. O Palacete Scarpa começou a ser construído em 1921, sendo a primeira agência bancária de Sorocaba, além do primeiro edifício da cidade a ter três pavimentos e elevador, do tipo gaiola. Ao longo das décadas, o prédio deixou de ser Banco e já abrigou um Hotel, Correios e a Delegacia Regional Tributária, da Secretaria Estadual da Fazenda e hoje é a sede da Secretaria da Cultura.

O promotor está na fase do procedimento preparatório para decidir se abre um inquérito e se abrir contra quem. Pode ser o secretário da Cultura, o prefeito ou a prefeitura. Pode ser contra o Sesc (organizador da Trienal e quem selecionou a artista), pode ser contra a artista que teria apresentado um projeto e entregue outra obra. Enfim, além de definir contra quem será o inquérito, o promotor ainda vai ouvir o Conselho Municipal do Patrimônio Histórico, colocar tudo na balança “e decidir tecnicamente, o meu gosto não estará em questão”, frisou o promotor.

Conclusão

A obra de Panmela Castro acelerou a compreensão do que significa a Trienal de Artes, que está em sua segunda edição e tem organização do Sesc, para uma cidade tradicionalista como Sorocaba. O debate em torno da obra poderia ter ficado limitado a pessoas do círculo artístico, mas ganha horários em programas de rádio, espaço na TV, nos jornais que são alimentados e retroalimentados nas redes sociais, igrejas, Câmara, Ministério Público e talvez, pelo andar dos acontecimentos, até a Justiça. O mais importante de tudo, o cidadão comum não só diz o que pensa, acha, vê, mas se toca de que algo, ao ser representado, gera interpretações diferentes bastante relacionados à história da pessoa. Quem sabe, a partir desse raciocínio, não se diminua a intolerância (raça, credo, sexualidade…) e as pessoas compreendam que existem diferenças. Só. Que a partir das Frestas, tema deste ano da Trienal, o sorocabano seja capaz de estabelecer relações possíveis de uma coisa (fato, obra, opinião, pensamento… seja lá o que for) e o que se compreende dessa coisa a partir das limitações impostas pela linguagem, seja qual for a escolhida para uma manifestação. Um sonho esse, Meu sonho.

 

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